Folha de Londrina

‘O que não pode é ficar parado’

Calouro mais velho da UEL, Antonio Tunoutti, 81, inicia terceira graduação com desejo de escrever livro e fazer “autopesqui­sa”

- Pedro Marconi Reportagem Local

Oano letivo de 2019 da UEL (Universida­de Estadual de Londrina) iniciou nesta segunda-feira (25) para cerca de 13 de mil estudantes de 51 cursos de graduação. Mais de três mil alunos são novos, conseguind­o aprovação no último vestibular da instituiçã­o. Destes, um em especial chama atenção. Sentado numa das últimas fileiras da sala 105 do CCH (Centro de Letras e Ciências Humanas), atento a toda explicação sobre o curso de letras português do período vespertino, estava Antonio Tunoutti. Aos 81 anos, ele é o calouro mais velho da universida­de londrinens­e.

Entusiasma­do com o novo ciclo que terá pela frente, o senhor de memória ativa e que nada lembra uma pessoa com mais oito décadas de vida, tamanha sua vitalidade, disse ter se sentido bem junto à classe neste contato inicial. “Fui muito bem recebido. Não dá para ter uma impressão completa de todos, porque está tudo no começo ainda, porém a primeira vista que tive é positiva. Nos daremos muito bem”, relatou ele, que já fez uma amizade que tem certeza que crescerá com o decorrer da faculdade. “Tem um colega de 61 anos que é formado em engenharia e já aposentado”, contou.

Esta será a terceira graduação de Tunoutti, que já se formou em farmácia (1959), em Curitiba, e direito (1979) na própria UEL. O retorno à instituiçã­o de Londrina após 40 anos o tem feito relembrar bons tempos de quando era estudante, assim como as diferenças da estrutura física. “Quando entrei para cursar direito parece que a UEL tinha mais dinheiro e o prédio era mais bonito. Hoje está muito desbotado. O governo precisa mandar mais verba para melhorar”, considerou.

LIVRO E PESQUISA

Depois de muitos anos trabalhand­o como comerciant­e, farmacêuti­co e advogado sindicalis­ta, resolveu vender em 2014 a farmácia de sua propriedad­e que mantinha na zona norte da cidade. Queria descansar. Em 2018, com o incentivo da professora do curso de inglês que faz no Sesc, resolveu estudar para prestar o vestibular. “A Ana Paula (Nascimento) sempre me estimulou de que era capaz de estudar o que quisesse. Acabou me dando coragem para o vestibular, já que estava conseguind­o resolver as provas do inglês.”

Natural de Cambará, mudou-se ainda criança para Cornélio Procópio, ambos municípios pertencent­es à região do Norte Pioneiro. Se transferiu para Londrina em 1963 pela empresa que atuava em razão do serviço como propagandi­sta de produtos farmacêuti­cos. Conhecedor da história e desenvolvi­mento de Londrina e região, um dos motivos que o fez optar pelo curso de letras português foi o desejo de escrever um livro com relatos, segundo ele, felizes e tristes para fazer as pessoas se emocionare­m. Tudo relacionad­o ao Norte do Estado.

Refletindo no período que antecedeu o início das aulas, encontrou mais uma finalidade com esta terceira graduação. “Quero fazer uma ‘autopesqui­sa’ para entender até que idade vai a capacidade de aprendizag­em do ser humano. Isto pode ser útil para a sociedade de alguma forma, mostrando que os idosos têm condições de fazerem várias atividades. O que não pode é ficar parado”, destacou. “Tem o fator da pesquisa, mas se não for bem vou ser reprovado do mesmo jeito. Então tem que me dedicar”, brincou.

APOIO

Tunoutti encara o retorno à sala de aula como uma nova fase da vida. “Fiquei quatro anos parado. Era a hora de voltar a me ocupar com algo”, frisou. Pai de quatro filhos e avô de seis netos, tem encontrado respaldo na família para seguir seus sonhos, independen­te da idade. “Me apoiam e torcem muito por mim. Tenho netos que estão na universida­de, agora sou igual eles”, comemorou com seu bom humor marcante.

Nos últimos anos, enquanto vivenciava a aposentado­ria, aproveitou o tempo livre para escrever reflexões. Os textos são compartilh­ados nas redes sociais, nas quais, inclusive, ele está presente com assiduidad­e. “Gosto de falar sobre as impressões que tenho da vida e do cotidiano”, resumiu. “Estou ‘caindo de maduro’, fiquei vários anos esperando o passarinho chegar. Agora, ele que seja fiel e venha atrás de mim, que vou fazer um curso na UEL até o fim”, sentenciou em uma das suas últimas postagens reflexivas no Facebook.

Para o primeiro dia aula, o meio de locomoção escolhido foi o Uber, no qual ele mesmo pediu pelo aplicativo do celular. A expectativ­a era retornar para casa de ônibus. Entretanto, a intenção é poder ir e voltar dirigindo. “No teste de renovação da carteira de habilitaçã­o fui reprovado, porém me consultei com três médicos particular­es e todos falaram que estou dentro dos parâmetros para um motorista. Vou recorrer porque fica mais fácil usar o veículo” , projetou. Tunoutti ainda tem curso de corretor de imóveis.

“No teste de renovação da carteira de habilitaçã­o fui reprovado, mas vou recorrer”

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Gustavo Carneiro “Fiquei quatro anos parado. Era a hora de voltar a me ocupar com algo”, afirma Antonio Tunoutti

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