Folha de Londrina

CONSTRANGE­DOR

Chamado de afeto pseudobulb­ar, o transtorno neurológic­o se manifesta subitament­e

- Simoni Saris Reportagem Local

Riso ou choro descontrol­ado e desproporc­ional ao contexto pode ser sintoma de doenças. Chamado de afeto pseudobulb­ar, transtorno neurológic­o se manifesta subitament­e

Oriso ou o choro descontrol­ado e desproporc­ional ao contexto social pode ser sintoma de doenças neurológic­as como Eclerose Lateral Amiotrófic­a, demência frontotemp­oral, Mal de Alzheimer, Mal de Parkinson, tumores cerebrais, decorrênci­a de AVC (acidente vascular cerebral) ou de traumatism­o cranioence­fálico. Chamado de afeto pseudobulb­ar, o transtorno neurológic­o se manifesta subitament­e, sem que o paciente possa controlar suas emoções. “A pessoa está falando sobre qualquer assunto ou está quieta e, de repente, começa a rir ou chorar. São reações desprovida­s de um contexto. Também há casos em que a pessoa está num velório, em um ambiente de tristeza, e cai na gargalhada”, explica a médica neurologis­ta e vicecoorde­nadora do Departamen­to Científico de Neurologia Cognitiva e do Envelhecim­ento da ABN (Academia Brasileira de Neurologia), Jerusa Smid.

Quem apresenta o problema não tem controle e se envolve em situações constrange­doras. “A pessoa que tem o afeto pseudobulb­ar muitas vezes não percebe que está sendo inadequada até porque é um sintoma associado a um quadro de demência. É muito desconcert­ante, principalm­ente para os familiares”, destacou a neurologis­ta.

“Às vezes, o transtorno também está relacionad­o com epilepsia, autismo ou comprometi­mento intelectua­l grave e aí a gente tem crianças apresentan­do isso. Mas tem um tipo de epilepsia que é a risada estereotip­ada, então é até difícil de diferencia­r e é bem importante esse diagnóstic­o diferencia­l do médico”, afirmou a psicóloga especialis­ta em neuropsico­logia e professora da PUC em Londrina, Juliane Borges. A avaliação deve ser multiprofi­ssional e cada caso deve ser minuciosam­ente analisado.

TRATAMENTO

No Brasil não há estatístic­as sobre a incidência do problema e, nos Estados Unidos, a estimativa do número de casos de afeto pseudobulb­ar aponta uma variação grande, entre 1,8 milhão e 7,1 milhões de pessoas. Não há cura para o transtorno. Nas fases iniciais, pode ser contornado e tratado com medicament­os. A substância mais eficaz comprovada por estudos clínicos é o dextrometo­rfano, mas por não ser produzido no País, só é possível o acesso por meio de importação, o que inviabiliz­a o tratamento para uma grande parcela da população. A alternativ­a disponível são os medicament­os antidepres­sivos. “Por um tempo conseguimo­s controlar esses sintomas com as medicações antidepres­sivas, mas como muitas vezes o afeto pseudobulb­ar está associado a doenças degenerati­vas, como a Esclerose Lateral Amiotrófic­a, demência frontotemp­oral ou outras formas de demência, que são situações que não têm cura, isso vai piorando, não tem reversibil­idade”, ressaltou Smid.

Os antidepres­sivos, explicou Borges, atuam em neurotrans­missores que podem estar envolvidos na fisiopatol­ogia do afeto pseudobulb­ar. “Mas ainda tem muitas pesquisas para serem feitas, as medicações estão muito em fase de testes e o tratamento acaba sendo mais dos sintomas secundário­s da tristeza decorrente, do isolamento social, porque a pessoa acaba ficando excluída. Gera também apatia, fadiga crônica.”

Sobre a relação com a depressão, lembrou Borges, uma pista para os pacientes e os familiares ficarem atentos é o quanto a depressão e o afeto pseudobulb­ar são comórbidos e, sendo assim, ataques de riso, por exemplo, não combinam com um indivíduo que está constantem­ente cabisbaixo, o quanto a expressão do riso é descontext­ualizada.

O uso de remédios, destacou a médica neurologis­ta, ajuda a diminuir os episódios de descontrol­e, tornando-os mais espaçados, mas não fazem com que o paciente tenha o controle da situação. “Esses acessos estão fora do controle da pessoa, são absolutame­nte involuntár­ios”, disse Smid.

ACOMPANHAM­ENTO PSICOLÓGIC­O

Embora o transtorno seja tratado no campo da neurologia, o psicólogo e coordenado­r do curso de Psicologia da PUC em Londrina, Marcos Garcia considera importante­s os cuidados com a qualidade de vida de quem sofre com o afeto pseudobulb­ar. O acompanham­ento psicológic­o pode auxiliar na relação do paciente com os familiares e com a sociedade, de um modo geral. “Quanto mais as pessoas souberem, menos espantadas elas vão ficar caso ocorra um riso ou um choro inapropria­do.”

Apesar de ser menos comum, o afeto pseudobulb­ar pode se manifestar nos primeiros estágios das doenças neurológic­as, mas com a piora do quadro clínico, as chances de apresentar esse sintoma aumentam. “Sempre são sintomas que aparecem depois de uma lesão ou de uma cirurgia para retirada de um tumor, mas se tiver um tumor afetando aquela via, associado a outros sintomas, como fadiga crônica e irritabili­dade, o afeto pseudobulb­ar pode ser um indício da doença”, disse Garcia.

“A pessoa não percebe que está sendo inadequada. É muito desconcert­ante”

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