Folha de Londrina

A vida na roça

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Às 5 horas da manhã, minha mãe já estava em pé ligando o rádio a pilha, na Rádio Bandeirant­es de São Paulo, para ouvir programas sertanejos, em que tocavam as mais belas músicas sertanejas de raiz. O delicioso cheiro de café espalhava pela casa. A mesa posta com os pães feito em casa no dia anterior - como era trabalhoso cilindrá-los! Na chapa quente do fogão a lenha, a polenta que sobrou do jantar com uma bela fatia de queijo em cima era assada, ficando bem crocante. Tinha a manteiga, as bolachinha­s e frutas. Nosso pai já tinha ido ao curral ordenhar a vaca malhada, trazendo um jarro de leite que era colocado para ferver.

O dia estava começando. Ainda escuro, cada um pegava sua enxada e outras ferramenta­s e subiam o carreador para a roça. Nós, os menores, íamos tratar dos animais, debulhando milho para as galinhas, abastecer de água o “chiqueiro”, picar abóbora e mandioca para os porcos, irrigar a horta com o regador.

Quando era pelas 10 horas, a mãe preparava o almoço, com arroz, feijão, carne de porco da lata, frituras que podiam ser mandioca, abobrinha, banana e uma salada. Tudo em duas cestas de taquara e levávamos carreador acima. Nossos irmãos, já famintos, estavam no meio do carreador à espera. Maurinho, o caçula, levava a moringa de barro com água fresca tirada do poço. Ia também a garrafa de café coado no coador de flanela. Nosso pai estendia um pano branco no chão e lá,

Hoje com muitas saudades, lembro da labuta da roça e fico pensando, como minha mãe trabalhava e como, apesar de tudo isso, ainda teve nove filhos”

com meus irmãos mais velhos, fazia a refeição. Após o almoço, deitavam embaixo dos pés de café, para uma merecida soneca.

As crianças voltavam com as cestas e iam se arrumar para a escola rural.

Quando eram 3 horas da tarde minha mãe preparava o café e ela mesma levava para a roça. Hoje com muitas saudades, lembro da labuta da roça e fico pensando, como minha mãe trabalhava e como, apesar de tudo isso, ainda teve nove filhos. Sempre feliz, sorrindo, e com muita fé em Deus. Creio que se existe o paraíso após a morte, com certeza minha mãe está lá. Sem falar no meu pai que nunca mostrou cansaço ou desânimo, e todos os dias eram uma alegria para ele e que transmitia tudo isso para nós.

Todos retornavam à tardinha para casa, após o banho, jantávamos, e descansáva­mos na grande varanda, ouvindo os programas de rádio. Ah, ficava imaginando como era a Cidade de São Paulo, do Rio de Janeiro... Aos sábados à noite, o pai sintonizav­a na rádio Nacional do Rio de Janeiro, para ouvirmos o programa “Balança Mas Não Cai”. Como ríamos! Muita alegria.

Certa vez meu irmão Álvaro disse que iriamos formar uma dupla sertaneja. Fiquei empolgado e por várias semanas ficamos “ensaiando” modas de Tônico e Tinoco, Lio e Léo, entre outros. Falava que o próximo circo que viesse no vilarejo, nós iriamos cantar. Mas não deu nada certo.

O tempo passou e muitos dos meus entes querido já se foram, mas os ensinament­os dos meus pais, a convivênci­a com meus irmãos, e a vida na roça foram a base da nossa educação.

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