Folha de Londrina

Fernando Pessoa não viu a churrasque­ira

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Marcão tinha 17 anos. Marcelinho, 16. Corintiano­s roxos, eram tão diferentes no tamanho que não pareciam irmãos. Estudávamo­s juntos desde a 6ª série, em Araçatuba. Certo dia, no intervalo das aulas do 2º colegial, alguém trouxe a notícia de que havia acontecido um acidente na Rodovia Castelo Branco. Marcão teve morte imediata; Marcelinho foi internado em estado gravíssimo e morreu dias depois.

Aquele foi meu primeiro contato com a morte de duas pessoas tão jovens e tão próximas. Certas vezes eu acordava no meio da noite, achando que tudo havia sido um sonho. De manhã, caminhando para a escola, eu me flagrava pensando que os dois irmãos estariam juntos na aula de matemática do Zé Fernando. Mas não estavam.

Dr. César, o pai dos meninos, conversava com o cachorro. Passava horas na varanda, ao lado do cão policial; acariciava-lhe o pelo e contava histórias em voz baixa. O bicho olhava o médico com amor e pena; também tinha saudade dos meninos, esperava que um dia eles entrassem falando e rindo por aquela varanda, com suas mochilas. Em poucos dias, Dr. César envelheceu alguns anos.

Era o ano de 1986. Sarney havia lançado o Plano Cruzado e prometia acabar com a inflação. A TV repetia o dia inteiro: “Tem que dar certo”. Os preços foram congelados, mas os produtos sumiram das prateleira­s. Lembro-me de um debate no Congresso entre o ministro da Fazenda, Dilson Funaro, e o senador Roberto Campos. Todos nós torcíamos pelo Funaro e execrávamo­s Campos. Estávamos redondamen­te enganados: o Cruzado não deu certo e a inflação voltaria com toda força. Roberto Campos tinha razão.

Um grupo de estudantes do colégio foi acampar em Panorama, à beira do Rio Paraná; eu estava entre eles. Por

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