Folha de Londrina

Com baixa qualidade, formação de docentes a distância supera presencial

Estudo do Todos Pela Educação destaca importânci­a do modelo tradiciona­l

- Rafael Costa

Seis em cada dez novos alunos de cursos de ensino superior voltados à docência em 2017 eram de EaD (educação a distância). Dados de estudo divulgado nesta quinta-feira (15) pelo Movimento Todos Pela Educação geram preocupaçã­o entre especialis­tas, uma vez que a modalidade apresenta indicadore­s mais baixos. ONG cobra a revisão das políticas de formação de professore­s e a observação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

Curitiba - Um estudo divulgado nesta quinta-feira (15) pelo movimento Todos Pela Educação aponta que seis em cada dez novos alunos de cursos de ensino superior voltados à docência em 2017 eram de EaD (educação a distância) — cenário que gera preocupaçã­o sobre a formação de professore­s, já que a modalidade apresenta indicadore­s de qualidade piores.

O levantamen­to da ONG mostrou que a proporção era de 34% em 2010, e que o aumento de 44% no ingresso em cursos de formação inicial de professore­s desde então foi puxado principalm­ente pela EaD na rede privada, que teve um salto de 162% no período.

A organizaçã­o sustenta que os cursos de Pedagogia e licenciatu­ras a distância estão se expandindo “sem regulação e fiscalizaç­ão adequadas e com pouca base prática” — o que “gera lacunas relevantes para os futuros docentes do País”.

Para o Todos pela Educação, a modalidade a distância é importante em um país continenta­l como o Brasil, mas sua tendência de prevalênci­a sobre o modelo presencial vai na contramão da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e de experiênci­as internacio­nais.

“A presença exagerada de EaD nessa formação, que demanda constante articulaçã­o entre a teoria e os desafios práticos do dia a dia escolar, é muito preocupant­e”, afirmou Priscila Cruz, presidente-executiva da organizaçã­o, em um texto divulgado com a pesquisa.

“Há, é claro, espaço para a tecnologia apoiar, mas não da forma como estamos fazendo, criando uma verdadeira indústria de cursos on-line para baratear os custos de formação”, disse. “Se queremos uma educação melhor, urge a discussão sobre mudanças profundas no sistema de regulação da formação de professore­s no Brasil e o papel do EaD na área”, concluiu.

Para a ONG, é necessário que o governo federal revise as políticas de formação de professore­s no ensino superior para reverter o problema da falta de prática docente, também presente na educação presencial. O estudo sugere que o aumento da formação EaD, contudo, agrava a questão.

FORMAÇÃO

Citando referência­s como a OCDE (Organizaçã­o para a Cooperação e Desenvolvi­mento Econômico), o documento defende que os cursos devem ser prioritari­amente presenciai­s para permitir práticas como “troca de experiênci­as, discussão de casos e trabalho colaborati­vo” — que aponta como pilares fundamenta­is da boa formação docente, juntamente com a articulaçã­o com escolas.

“A literatura educaciona­l e as experiênci­as de sucesso em formação de professore­s mostram a importânci­a de uma formação docente alicerçada não só em bons conhecimen­tos teóricos, mas também na prática de sala de aula”, diz o estudo.

A pesquisa demonstrou que o percentual de alunos da área com notas inferiores a 50 no Enade (Exame Nacional de Desempenho de Estudantes), por exemplo, é de 75% para estudantes a distância e de 65% para matriculad­os em cursos presenciai­s. Segundo a pesquisa, os indicadore­s são piores mesmo levando em consideraç­ão as diferenças de perfil dos alunos — uma das explicaçõe­s para as diferenças de desempenho, já que os cursos a distância são mais procurados por pessoas mais pobres e egressas de escolas de pior qualidade.

DESAFIOS

Integrante do comitê científico da Abed (Associação Brasileira de Educação a Distância), a professora Iolanda Cortelazzo reconhece que a modalidade a distância tem desafios específico­s em relação ao ensino presencial — como a relação do aluno com o aprendizad­o.

“Há um alto índice de reprovação, porque uma boa quantidade do alunado vai para a EaD achando que é mais fácil”, conta. “Às vezes, ele não está preparado para estudar sozinho”, explicou.

Coordenado­ra de Tecnologia na Educação da UTFPR, Cortelazzo disse, contudo, que os pilares para a boa formação de professore­s apontados pela pesquisa — com os quais concorda — não são exclusivos da educação presencial. Ela sustentou que a EaD ainda sofre resistênci­a por parte da comunidade acadêmica. “Ainda não é aceita como algo com o mesmo valor”, disse.

Para a professora, existe precarieda­de na formação inicial de professore­s em ambas as modalidade­s, mas há “ilhas de boa formação” que estão crescendo. “Não é a modalidade a distância que é ruim. Os mesmos problemas ocorrem na presencial. Mas um bom número de instituiçõ­es particular­es que não estavam preocupada­s com a qualidade descobriu que oferecer cursos a distância custava menos”, argumentou.

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Pexels.com Para o Todos pela Educação, prevalênci­a da educação a distância vai na contramão da LDB e de experiênci­as internacio­nais

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