Folha de Londrina

As reações ao projeto de Abuso de Autoridade

Ministro Moro e membros da Lava Jato criticam a aprovação da lei que pretende regulament­ar atuação de policiais e membros da Justiça

- Pedro Moraes

Aprovado com regime de tramitação urgente, o projeto de lei sobre abuso de autoridade foi alvo de críticas nessa quinta-feira (15), dia seguinte à votação de maneira simbólica – sem contar os votos individuai­s dos deputados presentes – na Câmara dos Deputados. A proposta é endurecer as punições para ações indevidas de agentes públicos, como juízes, promotores e policiais. Apesar de os deputados ainda terem que votar os destaques, o que pode trazer pontuais mudanças, há vários artigos criticados por serem considerad­os abertos para a interpreta­ção dos futuros julgadores. O projeto havia sido votado no Senado e estava parado na Câmara desde 2017. Por isso, deverá seguir para sanção presidenci­al.

A expectativ­a, no entanto, é que o presidente Jair Bolsonaro vete parte do texto. O ministro da Justiça e da Segurança Pública, Sergio Moro, afirmou que o governo irá avaliar a lei. “Ninguém é a favor de abusos, mas o projeto precisa ser bem analisado para verificar se não pode prejudicar a atuação regular de juízes, procurador­es e policiais. O exame ainda será feito com o cuidado e o respeito necessário­s ao Congresso”, escreveu Moro, por meio de nota enviada pela assessoria de imprensa do ministério. Em entrevista à TV Câmara, vice-líder do PSL na Casa, Bia Kicis (RJ), afirmou que o presidente deverá vetar trechos que considere abusivos quando for sancioná-la. “Entramos em contato com o presidente e com o Palácio e é certo que o presidente vai vetar aqueles artigos que ele entende que são realmente abusivos”, garantiu.

O projeto é apontado como uma reação aos procedimen­tos adotados pela força tarefa da Lava Jato no MPF (Ministério Público Federal). Tanto que há artigos informalme­nte batizados com nomes e políticos como, por exemplo, “Lula”, que veda condução coercitiva sem prévia intimação e outro que trata da divulgação de gravações, e outro como “Cabral”, que proíbe algemar presos quando não há resistênci­a à prisão ou risco de fuga. O coordenado­r da força-tarefa da Lava Jato no Paraná, Deltan Dallagnol, se pronunciou pelo Twitter. “Se isso é crime, deveria ser igualmente crime soltar preso ou deixar de decretar a prisão quando esta é necessária. Do modo como está, juízes que prenderem poderosos agirão debaixo da preocupaçã­o de serem punidos quando um tribunal deles discordar. E Direito não é matemática”, escreveu.

OPINIÕES

A FOLHA ouviu o procurador aposentado do MPFPR, um dos precursore­s da Lava Jato, Carlos Fernando dos Santos Lima. Ele acredita que o projeto se trata de uma vingança de setores atingidos por trabalhos da Lava Jato e outras grandes investigaç­ões. “Não existe lógica. O que está tentando se criar é uma atmosfera de temorizaçã­o de agentes públicos. Os juízes e procurador­es agora correm o risco de virem a responder administra­tiva e judicialme­nte a inúmeros questionam­entos por suas decisões”, criticou Lima, que continuou. “Deixar de conceder habeas corpus ou prender quando não é o caso, o juiz sempre justifica e sempre tem recursos. Um país que não respeita investigad­ores, juízes, não é um país certo”, criticou o ex-procurador, que foi incisivo em sua crítica ao Congresso. “Mais uma vez o deputado Rodrigo Maia, na calada da noite, conseguiu excluir o combate à corrupção no País”.

Já o delegado aposentado da PF (Polícia Federal) Gerson Machado – que fez investigaç­ões utilizadas na origem dos trabalhos da Lava Jato – ressaltou que o projeto de tamanha importânci­a não poderia ser debatido e aprovado no mesmo dia em que foi pautado, ainda mais com requerimen­to de urgência. “Ao que tange a conduta policial, também seriam necessário­s debates com as instituiçõ­es, no intuito de aparelhar e treinar os servidores para o cumpriment­o de condutas tipificada­s, para que tenham a segurança de não ser colocado no constrangi­mento de ter de responder processo de sindicânci­a ou acusatório. O policial precisa ter tranquilid­ade e respaldo prévio para operar”, criticou.

MUDANÇAS

Entre as mudanças apontadas na nova lei está a proibição de decretação de prisão provisória em “manifesta desconform­idade com as hipóteses legais” e também a decretação de condução coercitiva sem que antes haja intimação para comparecim­ento ao juiz. A pena é de um a quatro anos de detenção. O texto também prevê que a autoridade possa ser punida com seis a dois anos de detenção, além de multa, caso deixe de se identifica­r ou se identifiqu­e falsamente para o preso no ato de seu encarceram­ento. Outro artigo estabelece pena de um a quatro anos para quem deixar presos do mesmo sexo confinados juntos.

 ?? Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil ?? Moro disse que o governo irá avaliar a lei: “Ninguém é a favor de abusos, mas o projeto precisa ser bem analisado para que não prejudique a atuação de juízes, procurador­es e policiais”
Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil Moro disse que o governo irá avaliar a lei: “Ninguém é a favor de abusos, mas o projeto precisa ser bem analisado para que não prejudique a atuação de juízes, procurador­es e policiais”

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil