Folha de Londrina

Depressão e falta de dinheiro afetam atletas com parada precoce

- Toni Assis

São Paulo - Foi em uma entrevista coletiva em julho que Adílson, volante de 32 anos do Atlético-MG, fez um anúncio inesperado: diagnostic­ado com uma cardiomiop­atia hipertrófi­ca, decidiu encerrar a carreira. A doença, que engrossa o músculo cardíaco e dificulta o bombeament­o de sangue, é a mesma que fez com que Serginho, zagueiro do São Caetano, caísse morto no gramado durante uma partida em 2004.

O jogador recebeu apoio do clube, que o orientou e o auxiliou a tomar a decisão de abandonar os gramados. Mas nem sempre isso acontece. Segundo Luciana Angelo, especialis­ta em psicologia do esporte, a aposentado­ria repentina pode ser um trauma para atletas que não estavam preparados para assumir outras funções profission­ais.

“A depressão e o sentimento de abandono são as consequênc­ias para alguém que não se preparou e não tem capacidade muito rápida de adaptação”, disse Luciana.

Foi o que aconteceu com Éverton Costa, ex-atacante do Vasco. Após sofrer uma arritmia cardíaca em 2014, durante uma partida contra o Resende pela Copa do Brasil, ele se aposentou aos 29 e perdeu a renda confortáve­l da época na ativa.

“Aí vêm a preocupaçã­o e a tristeza, pois ele não podia nos dar o mesmo padrão de vida. O Éverton via os jogos e às vezes chorava”, conta Neiva Amaral, esposa do jogador.

Para Nabil Ghorayeb, cardiologi­sta e médico do esporte do Hospital do Coração (Hcor) em São Paulo, a questão financeira é um complicado­r que leva atletas a omitirem problemas de saúde para evitar perder um lugar no time. “Muitos deles vêm de origem humilde. Os salários que ganham sustentam a família”, explica o médico.

A solução natural encontrada após a parada é tentar uma carreira na comissão técnica. Adílson se tornou auxiliar do treinador Rodrigo Santana no AtléticoMG. Já Éverton foi analista de desempenho no Coritiba e fez o curso para treinador de futebol pela Federação Gaúcha de Futebol.

Ser técnico também é o objetivo do ex-volante Fernando, irmão do recém-aposentado meia Carlos Alberto (ex-Corinthian­s e São Paulo). Ele chegou a ser auxiliar de Marcelo Salles (que recentemen­te comandou o Flamengo interiname­nte após a demissão de Abel Braga) no Bonsucesso, mas não se firmou. Hoje, aos 33 anos, dá aulas numa escolinha de futebol na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro.

Os problemas dele começaram em 2016, após um choque durante um treinament­o. “Meu pescoço fez um movimento brusco, causando a dissecção da artéria vertebral direita”, lembra ele.

A gravidade do problema só foi totalmente conhecida uma semana depois, quando desmaiou em um supermerca­do. Apesar da pressão para voltar a jogar rapidament­e, disse que queria investigar mais a fundo sua saúde. Descobriu, então, que sofrera um AVC (acidente vascular cerebral). “Foi um baque. A família foi muito importante”, conta ele.

A família também foi o que deu forças a Narciso. Bronze com o Brasil nos Jogos Olímpicos de Atlanta96, o ex-volante do Santos já tinha sua transferên­cia encaminhad­a para o Hertha Berlin quando foi diagnostic­ado com uma leucemia que o manteve afastado dos gramados. Voltou a jogar em 2003. “Foi uma vitória. Um momento difícil em que a ajuda da família foi muito importante” afirmou. Ele hoje é outro dos que atuam como treinador.

Já Fabrício Carvalho, atualmente com 41 anos, buscou forças na fé. O jogador do São Caetano ficou dois anos sem atuar por causa de uma arritmia cardíaca, constatada em 2004. Enquanto fazia o tratamento, tornouse cantor de música gospel e gravou dois CDs.

“Nesse período, eu me apeguei a Deus e encarei tudo isso como um livramento. Foi uma oportunida­de de passar a mensagem de Deus”, afirmou. Ele continuou atuando em equipes mais modestas até 2015. Seu último clube foi o Taboão da Serra-SP.

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Alessandra Torres/Photopress/Estadão Conteúdo O ex-volante Adílson viu a carreira terminar em julho, aos 32 anos, após descobrir um problema no coração

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