Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná celebra 40 anos do primeiro transplante de medula da América Latina
Procedimento pioneiro foi feito no hospital em 1979, sob liderança do médico Ricardo Pasquini
Curitiba - No pronto-socorro da pequena Cristalândia, no interior de Tocantins, ninguém fazia ideia do que estava causando as dores de ouvido e febres que atormentavam o pequeno Álvaro desde os 2 meses de idade.
A mãe, Giovana Carvalho, estava indo cada vez mais longe em busca de respostas. Primeiro, foi aconselhada a ir a um hospital regional em uma cidade vizinha, mas novas infecções continuaram aparecendo sem causa conhecida. A criança foi, então, levada para capital do Estado, Palmas, onde seu quadro também continuou se agravando.
Depois de mais uma transferência, desta vez para Brasília (DF), finalmente veio o diagnóstico: Álvaro tinha uma imunodeficiência rara — a doença granulomatosa crônica —, com indicação para TMO (transplante de medula óssea).
Forçada a deixar o emprego de balconista enquanto ia de cidade em cidade com o filho, Giovana estava contando com serviços públicos. A criança precisava ser transferida para um hospital com serviço de transplante pelo SUS (Sistema Único de Saúde). A melhor alternativa era clara para a médica responsável por Álvaro na capital federal: encaminhálo ao serviço de TMO do CHCUFPR (Complexo Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná), aos cuidados da equipe de TMO Pediátrico chefiada por Carmem Bonfim.
Álvaro — que completou seu centésimo dia pós-transplante na semana passada, com medula doada pelo pai — é um dos muitos casos de pacientes encaminhados ao HC todos os anos por médicos e instituições de todo o País que têm o hospital universitário como referência em TMO.
A reputação está ligada a uma história de pioneirismo: ali foi realizado o primeiro transplante deste tipo na América Latina, em 1979 — fato que completa 40 anos nesta terça-feira (15).
Quatro décadas e cerca de 2,8 mil TMOs depois da iniciativa liderada pelos médicos Ricardo Pasquini e Eurípedes Ferreira, o hospital realiza em torno de uma centena de transplantes por ano.
O serviço atende pacientes com doenças hematológicas cuja única opção de cura é o transplante — dentre elas, casos de leucemias agudas de alto risco de recaída, falências medulares como anemia aplástica severa e anemia de Fanconi.
A maioria envolve doadores aparentados ou não aparentados — os chamados transplantes alogênicos, mais complexos do que os transplantes autólogos (hoje, disponíveis em um número maior de instituições).
“O único serviço totalmente público do Estado que consegue atender todos os níveis de complexidade é o nosso”, explica o supervisor médico da UTOH (Unidade de Transplante, Oncologia e Hematologia) do CHC-UFPR, Samir Nabhan. “Existem poucos serviços públicos de transplante de medula óssea no Brasil com o mesmo nível de complexidade do HC”, diz.
O serviço atende a cerca de 15 leitos simultaneamente — número insuficiente para a demanda, apesar da criação de serviços de transplante em outros hospitais com o passar dos anos. A capacidade do HC supera 20 leitos, mas há falta de recursos humanos.