Degradação ambiental está na origem da pandemia
Ambientalistas alertam que se a população não reverter os danos ao meio ambiente outras pandemias como a do coronavírus virão
Do colapso nos sistemas de saúde à ameaça de forte recessão econômica, são notórios os impactos negativos da pandemia do novo coronavírus na sociedade global. Mas o avanço da propagação da Covid-19 no mundo tem um outro lado. Ele revela os efeitos devastadores da ação do homem sobre o meio ambiente ao longo das décadas e serve de alerta para o fato de que passou da hora de os habitantes do planeta pensarem em maneiras de conter a devastação ambiental ao mesmo tempo em que revisitam hábitos, costumes e culturas.
A despeito de teorias criadas sem nenhum embasamento científico e disseminadas nas redes sociais acerca da origem da doença, pesquisadores e estudiosos explicam que vírus como corona não se originam do nada. Esses microrganismos sempre estiveram presentes nas florestas ou nos animais silvestres o surto da doença. Em matéria publicada no último final de semana pelo jornal britânico The Independent, o pesquisador da Universidade de Harvard, Samuel Myers, lembra que nos mercados de Wuhan, na província central de Hubei, há um número extraordinário de espécies exóticas vivendo em gaiolas muito próximas umas das outras e dos humanos, de uma maneira jamais encontrada na natureza.
A perda da biodiversidade e o crescimento da população global, que deve passar dos atuais dois bilhões para 9,7 bilhões de pessoas em 2050, todas elas procurando por alimentos, não deixam dúvidas de que novas pandemias como a que estamos vivendo agora virão, afirmou Myers. A questão é: quando isso vai acontecer?
“Existe uma correlação entre o desmatamento e a destruição dos hábitos florestais com o surgimento das doenças. Inclusive se sabe que as doenças causadas por mosquito (dengue, zika vírus, febre chikungunya, malária e leishmaniose, por exemplo) têm uma relação intrínseca com o desmatamento. Quando desmata mais, surgem os vírus. A fauna silvestre fica exposta e esses microrganismos se aproximam da gente”, explicou a doutora em Ecologia e professora da Universidade Federal do Mato Grosso, Ana Lúcia Tourinho.
Na China, houve um agravante que é a questão cultural. A população tem por hábito ingerir animais silvestres e provavelmente foi ao consumir um animal infectado pelo vírus que a transmissão da Covid-19 entre humanos teve início. Não se trata aqui de culpar os chineses pela origem da doença, mas de alertar a população mundial para o fato de que a preservação de alguns costumes em uma época de forte degradação ambiental pode pôr em risco todo o planeta.
Tourinho cita um fato impressionante. Um estudo de 2007 da Sociedade Americana de Microbiologia já questionava se a humanidade estaria preparada para o ressurgimento da SARS (sigla em inglês para Síndrome Aguda Respiratória Grave). “Sabe-se que os coronavírus sofrem recombinação genética, o que pode levar a novos genótipos e surtos. A presença de um grande reservatório de vírus do tipo SARS-COV em morcegosferradura, juntamente com a cultura de comer mamíferos exóticos no sul da China, é uma bomba-relógio”, dizia o documento publicado há 13 anos. “A ciência não acompanha essa velocidade da mutação genética do vírus, que são microrganismos de estruturas muito simples, e por isso não consegue sintetizar um medicamento”, destaca a ecologista.