Folha de Londrina

Verão de 21

- Lúcio Flávio Moura é jornalista em Londrina

Já seria uma noite amigável. O LED resplandec­e no asfalto molhado, a brisa faz da vida bom lugar. Há oxigênio.

Nas ruas, o deserto da pandemia guarda um silêncio sorrateiro.

Há dores invisíveis.

A cidade ainda desfila nas duas mãos, no fluxo da rotina.

As vidas perambulam em busca de compaixão ou prazer, prosperida­de ou descalabro, em direção à oração dançante, ao balcão de farmácia, ao bingo pirata. A chuva passa e a peste é uma negação.

Um sábado, simpático como sempre, emanando leveza e liberdade.

É preciso viver, se distrair, conversar sobre o veraneio em Santa Catarina no churrasco, visitar a sogra, testar a moto nova, retomar a confraria do pôquer, ir ao aniversári­o do irmão da igreja, se perfumar para o primeiro encontro.

É preciso esquecer um pouco o peso da verdade nosso caminho é um grande campo minado pela peste - e lembrar das pequenas vacinas capazes de nos blindar dos demônios mais ordinários.

Nada demais, nada ruim, nada excelente.

Mas o cinza da previsibil­idade de um sábado qualquer, de repente, ganha cores.

Meio da cor do céu, meio da cor da paz, um clarão de gol vem de Belém.

E paira sobre nós.

Como o imponderáv­el é sempre uma possibilid­ade, o sábado não é mais comum.

É o décimo sexto dia de uma nova década e a redenção deixou o gramado do impossível.

Doce vingança da famigerada realidade.

Nada mais bonito que o brilho do inesperado. Nada mais memorável que uma glória repentina. No transe do alívio absoluto, ouço uma voz declamar a mensagem tatuada na alma deste sábado especial: Londrina Esporte Clube, esta paixão eterna.

E desde o isolamento das incertezas, ainda incrédulo com tamanha capacidade das divindades do futebol, escolho duas palavras que se impõem.

Obrigado, Tubarão!

“É o décimo sexto dia de uma nova década e a redenção deixou o gramado do impossível”

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