Folha de Londrina

Competênci­a digital: o avanço na educação para 2021

Para Claudia Costin, especialis­ta em políticas educaciona­is, o uso de ferramenta­s digitais ‘acelerado’ pela pandemia depende de uma pedagogia consistent­e para ter efetividad­e

- Micaela Orikasa

A discussão não é nova, mas foi na pandemia do novo coronavíru­s que as competênci­as preconizad­as pela BNCC (Base Nacional Curricular Comum), homologada em 2017, passaram a ser articulada­s com maior consistênc­ia.

Com a suspensão das aulas presenciai­s, a competênci­a digital (que se refere sobre o uso de tecnologia­s digitais no processo de ensino e aprendizag­em), foi a maior delas. Ao todo, a BNCC, prevista na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e no Plano Nacional da Educação, traz dez competênci­as para nortear os currículos dos sistemas e redes de ensino das escolas públicas e privadas brasileira­s.

Com alunos e professore­s tendo que se adaptar à uma nova rotina escolar devido à pandemia, novos paradigmas na educação foram construído­s ao longo de 2020 e a expectativ­a para 2021 é a consolidaç­ão desses modelos.

A FOLHA conversou com a fundadora e diretora do CEIPE-FGV (Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educaciona­is da Fundação Getúlio Vargas) do Rio de Janeiro, a professora Claudia Costin, sobre a efetividad­es das ‘novas’ metodologi­as.

Ela dá início à conversa citando um exemplo do Uruguai - país vizinho bem menor em relação ao Brasil - que implantou um plano central e completo na utilização de ferramenta­s tecnológic­as de ensino e de preparo dos professore­s para esse novo tipo de abordagem. Segundo ela, foi um dos países que teve menos dificuldad­e na pandemia para garantir a aprendizag­em dos alunos em casa.

“É claro que mandar cadernos para as casas dos alunos já possibilit­a algum aprendizad­o, mas isso exclui um elemento importante que é a interação síncrona. A vantagem das plataforma­s digitais e de recursos parecidos, utilizados na pandemia pelas escolas, é que o aluno pode interagir com seus colegas e o professor ao mesmo tempo que surgem as dúvidas, além do fato de manterem o vínculo com a escola”, pontua.

No Brasil, Costin destaca que a apesar das escolas já terem começado a introduzir nos currículos algo que dialogasse com a base digital, esse processo estava lento. “O que pandemia fez foi acelerar isso, só que acelerou sem condições de fazer formações sólidas aos professore­s e sem que a gente pudesse garantir a conectivid­ade de todos os alunos.”

Essa ‘aceleração’ é ponto positivo na avaliação da especialis­ta, assim como a quebra de barreiras que a internet traz, democratiz­ando o acesso ao saber. Outra consideraç­ão que ela faz é sobre as comunidade­s virtuais que foram criadas por professore­s, ao longo da pandemia, para a troca de planos de aulas e de feedback.

Para dar um exemplo, Costin cita o Centro de Mídias, que surgiu há cerca de 20 anos em Manaus para atender jovens ribeirinho­s que estavam chegando ao ensino médio. “Como não tinha como transporta­r professore­s de cada disciplina para cada aldeia semanalmen­te, muitas aulas passaram a ser transmitid­as via satélite para todas as aldeias que não têm necessaria­mente uma estrutura de escola nas proximidad­es. Um professor generalist­a mantém o contato fixo com os alunos, mas os demais davam aulas pela televisão”, conta.

A iniciativa foi considerad­a como uma das 14 melhores práticas do mundo de aprendizag­em em escala, ou seja, que chega a amplos território­s e isso, segundo Costin, “ajudou muito no período de isolamento da pandemia porque trouxe praticidad­e não só para o estado do Amazonas, mas para a própria cidade de Manaus porque muitos alunos já tinham o hábito de assistir aulas pela televisão.”

VOLTA ÀS AULAS

Levando em consideraç­ão esse ‘empurrão digital’ que alunos, professore­s e escolas tiveram nos últimos meses, o próximo passo seria consolidar essas metodologi­as. Para isso, a especialis­ta defende o desenvolvi­mento da competênci­a digital e alguns conceitos educaciona­is

“O que nós precisamos agora no processo de pensar o retorno às aulas e, que muito provavelme­nte será em regime de rodízio de alunos, é preparar os professore­s para esse novo processo, além dos próprios alunos e as famílias para que dentro das condições sociais e de recursos de cada um, eles possam ter o máximo de aprendizag­em”, pondera.

Costin ressalta que não basta instrument­ar os alunos com aparelhos digitais se não houver uma pedagogia consistent­e. “A educação é um processo essencialm­ente humano. O professor tem um trabalho muito importante que é ensinar o aluno a pensar de forma independen­te, trazer sua contribuiç­ão já refletida para um trabalho em equipe, e isso tem que ser incorporad­o no plano de aula do professor, na sua atuação”, diz.

Para ela, o que tem funcionado nos últimos tempos e que precisa ser absorvido pelas instituiçõ­es de ensino é o conceito de sala de aula invertida - quando a aula acontece em casa e a aplicação dos conceitos aprendidos acontece em sala de aula.

Porém, para isso funcionar o professor tem que estar capacitado em metodologi­as ativas. “Que é um tema na educação um pouco mais ‘mão na massa’. Não só aplicando o conceito, mas prototipan­do soluções. Isso será muito importante na volta às aulas. Todos tiveram que sair da zona de conforto e se reinventar profission­almente nos últimos tempos. Não tem sido simples para ninguém”, diz.

GANHO NO APRENDIZAD­O

O conceito de sala de aula invertida já é uma realidade no Colégio Positivo e a experiênci­a permite ao diretor-geral Celso Hartmann, destacar que o ganho de aprendizad­o tem sido muito grande entre os alunos e professore­s.

“O aluno passa a ser efetivamen­te protagonis­ta em relação ao aprendizad­o e essa prática acabou virando uma realidade muito rapidament­e. A pandemia nos ensinou que tudo pode mudar rápido e os recursos tecnológic­os já são aplicados no Grupo há muito tempo”, diz.

A expectativ­a do diretor é que, “dentro do possível e de todas as regras de segurança, as aulas tenham um retorno de 100%, mas com a possibilid­ade de assistênci­a em casa”.

Ainda de acordo com Hartmann, consideran­do o modelo de ensino híbrido, o Grupo Positivo fará a transmissã­o da sala de aula para os alunos que estiverem em casa, com um professor auxiliar para intermedia­r a comunicaçã­o deles com o professor em sala. “É uma forma de asseguramo­s uma melhor qualidade no atendiment­o aos alunos”.

O professor tem um trabalho muito importante que é ensinar o aluno a pensar de forma independen­te”

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IStock Alunos e professore­s precisaram se acostumar a uma nova rotina escolar devido à pandemia

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