STF vê risco à liberdade de expressão e barra direito ao esquecimento no Brasil
Em votação concluída na quinta (11), os ministros entendem que a criação desse instituto jurídico no país poderia botar em risco a liberdade de expressão
Brasília
- O STF (Supremo Tribunal Federal) rejeitou, por 9 votos a 1, a existência do direito ao esquecimento no Brasil. Em votação concluída nessa quinta-feira (11), os ministros entenderam que a criação desse instituto jurídico no país poderia botar em risco a liberdade de expressão.
Os ministros Dias Toffoli, Kassio Nunes Marques, Alexandre de Moraes, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Luiz Fux votaram contra o direito ao esquecimento, enquanto o ministro Edson Fachin se posicionou favoravelmente. Luís Roberto Barroso se declarou impedido para analisar o tema e não votou.
A avaliação predominante foi de que a Justiça não pode proibir um fato antigo de ser exposto ao público por respeito à privacidade e à intimidade da pessoa envolvida. Ao todo, a corte levou quatro dias de julgamento para concluir a discussão do tema.
A maioria dos integrantes do STF aprovou uma tese que deverá ser aplicada pelas demais instâncias e que determina que o direito ao esquecimento não existe para casos de “divulgação de atos ou dados verídicos e licitamente obtidos e publicados em meios de comunicação social analógicos ou digitais”.
Marco Aurélio, que acompanhou os colegas no sentido de declarar a inexistência do instituto, afirmou que a tese aprovada é temerária. Na visão do magistrado, o texto colocará uma “espada de dâmocles sob a cabeça da imprensa”, que só poderá publicar o que “tiver investigado e concluído se mostrar verídico ou ter obtido licitamente”.
“Nós desconhecemos um dado importantíssimo. A imprensa não pode comer barriga, a imprensa não é órgão investigativo para saber se o dado que lhe chega é um dado verídico ou não. E não cabe mitigar e admitir o direito ao esquecimento a partir do fato de se veicular algo que posteriormente se mostra ilícito”.
O ministro argumentou que a tese pode atrapalhar o trabalho da mídia. “Se a imprensa for compelida a isso ela não informa à sociedade brasileira porque vai ter que parar, vai chegar a stand by para contratar investigadores e aí ter um laudo a respeito do fato que lhe chegou”, disse.
DIREITO DE LEMBRAR
O julgamento foi retomado nessa quinta-feira com o voto de Cármen Lúcia, que se alinhou à maioria. A ministra recordou o período do regime militar e disse que a sua geração “lutou pelo direito de lembrar” e que tomar uma decisão no sentido contrário seria inadequado.
“Em um país de curta memória, discutir e julgar o esquecimento como direito fundamental, nesse sentido aqui adotado, ou seja, de alguém poder impor o silêncio e até o segredo de fato ou ato que poderia ser de interesse público, pareceria, se existisse essa categoria no direito, o que não existe, um desaforo jurídico”, afirmou.
A magistrada sustentou que não faz sentido proibir a veiculação de um fato verídico e obtido licitamente. “É preciso que se ponha luz para que a gente verifique e não se repita”, disse.
O julgamento ocorreu em um recurso com repercussão geral, o que significa que o entendimento fixado pela corte deverá ser seguido por todas as instâncias da Justiça.
O caso concreto debatido pelo plenário é um recurso movido por irmãos de Aída Curi, assassinada em 1958 no Rio de Janeiro. O programa Linha Direta, da TV Globo, exibiu, 50 anos depois, um episódio em que reconstituiu o crime.
Os familiares dela, que foi violentada e assassinada e cujo caso foi amplamente divulgado pela imprensa à época, pedem uma indenização ao canal de televisão.
Kassio Nunes Marques e Gilmar Mendes entenderam que os parentes dela deveriam, sim, receber uma indenização.