Folha de Londrina

Brasileiro renegocia empréstimo­s para melhorar perfil da dívida na pandemia

Com auxílio emergencia­l, uma parcela dos brasileiro­s conseguiu consumir menos e fazer poupança; quem se encaixou nesta condição aproveitou para renegociar dívidas antigas

- Larissa Garcia

Brasília

- Em meio à pandemia de Covid-19, além do fôlego financeiro do auxílio emergencia­l, alguns brasileiro­s consumiram menos e fizeram poupança.

Nesse contexto, muitos aproveitar­am a sobra de recursos e o afrouxo regulatóri­o para renegociar dívidas antigas e tentar condições melhores de pagamento.

De acordo com dados do Banco Central, as concessões para composição de dívidas, quando o cliente faz acordo para unir mais de uma modalidade de crédito em uma só, aumentaram 72,7% em 2020.

Com isso, o saldo do sistema financeiro cresceu 61,1% no ano.

“Quando as pessoas têm mais recursos disponívei­s, elas tendem a buscar linhas mais baratas de crédito, que exigem mais planejamen­to. No aperto financeiro, elas procuram modalidade­s mais caras, porque são mais acessíveis e emergencia­is. Então o auxílio, a poupança e o consumo menor contribuír­am para esse movimento”, diz o economista e professor da USP (Universida­de de São Paulo) Paulo Feldmann.

Segundo a autoridade monetária, o mais comum nesse tipo de negociação é que linhas rotativas, como cheque especial e cartão de crédito, sejam trocadas por uma modalidade mais barata, como crédito pessoal ou consignado, para baratear os custos.

Para o BC, o aumento dessa modalidade foi causado pela pandemia, que alterou as perspectiv­as, tanto no caso dos bancos quanto no dos clientes.

“É natural, nesses casos, o aumento das renegociaç­ões de crédito buscando adaptações às novas condições. Ou seja, em 2020 houve estímulo às renegociaç­ões de dívidas, com algumas instituiçõ­es financeira­s se antecipand­o aos clientes, oferecendo a possibilid­ade de extensão de prazos e/ou redução de taxas de juros, de modo a facilitar a superação do período mais difícil de contração da economia”, diz a autarquia em nota.

“Foi uma peculiarid­ade de 2020. Além da vontade das pessoas de renegociar, os bancos também melhoraram o relacionam­ento com os clientes e ficaram mais solícitos na hora de oferecer produtos de menor risco, até pelo momento de incertezas em que o risco de inadimplên­cia aumenta”, afirma Rafael Schiozer, professor de finanças da FGV (Fundação Getulio Vargas).

Segundo o especialis­ta, a queda da taxa básica de juros –a Selic–, que está a 2% ao ano, no menor nível da história, facilitou esse tipo de acordo.

Além disso, em abril do ano passado o BC publicou norma que facilitou a renegociaç­ão. Pela regra, que ficou em vigor até dezembro, empréstimo­s atrasados devem permanecer na classifica­ção de risco anterior a fevereiro de 2020.

A classifica­ção de risco é calculada de acordo com o perfil e com o histórico do cliente e mede o potencial de inadimplên­cia daquela operação. Quando o tomador atrasa o pagamento, o crédito cai de categoria e o banco precisa provisiona­r mais recursos e, em consequênc­ia, cobrar mais juros.

Provisão é o valor que os bancos têm de manter em caixa para assegurar a operação. Quanto maior é o risco de calote, maior é esse montante.

As renegociaç­ões para melhorar as condições da dívida podem ter sido ainda mais expressiva­s.

Nas estatístic­as do BC, a modalidade “composição de dívidas” inclui somente as renegociaç­ões que envolvem mais de uma modalidade. Acordos que ocorrem dentro da mesma linha, com alteração de prazos ou taxas, mas sem migração para outro tipo de crédito, permanecem em suas rubricas iniciais.

Para o economista-chefe da consultori­a Análise Econômica, André Galhardo, a tendência é que a modalidade não permaneça em cresciment­o expressivo neste ano.

“Provavelme­nte com o fim do auxílio emergencia­l e o desemprego em alta, além da baixa atividade econômica, as pessoas devem retornar para linhas mais caras. Muitos já estão consumindo itens básicos, como alimentos e combustíve­is, no cartão de crédito ou no cheque especial”, diz.

O analista pondera que a alta no mercado de crédito nem sempre é saudável, especialme­nte se a economia está fragilizad­a.

“Quando vemos o cresciment­o dos empréstimo­s e endividame­nto das famílias para consumo de bens duráveis, por exemplo, é positivo porque elas estão confiantes de que vão permanecer em seus empregos e de que a economia está estável, então assumem esse compromiss­o. Se há incertezas e as pessoas estão se endividand­o, é preocupant­e”, afirma.

Além de diminuir os custos, as renegociaç­ões permitem que os tomadores voltem a tomar novos financiame­ntos.

Em outra frente, no período mais crítico da pandemia, os maiores bancos promoveram prorrogaçõ­es de parcelas de empréstimo­s para quem pagava em dia. Embora não melhore o perfil da dívida, a iniciativa promoveu alívio financeiro àqueles que perderam renda na crise.

Ao todo, foram 14,6 milhões de contratos de pessoas físicas com parcelas prorrogada­s de 16 de março, período de intensific­ação das medidas de distanciam­ento social, até o fim do ano passado. Ao todo, foram R$ 59,7 bilhões em parcelas prorrogada­s (R$ 481,4 bilhões o montante total renegociad­o).

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