Pandemia gera quase 1,1 mil ações trabalhistas no PR
Em pouco mais de um ano, os tribunais trabalhistas brasileiros acumulam 217 mil ações relacionadas à pandemia do novo coronavírus; no Paraná, são quase 1,1 mil processos
Adequar as instalações do ambiente corporativo às normas sanitárias de prevenção contra a Covid-19 não é uma questão apenas de preservar a saúde e a vida dos funcionários e clientes. Adaptar o espaço de trabalho às regras exigidas nesse momento de pandemia pode resguardar as empresas de passivos trabalhistas. Em pouco mais de um ano, o Brasil contabiliza 217 mil processos relacionados à pandemia na Justiça do Trabalho e o valor total das causas ultrapassa os R$ 21 bilhões, o que corresponde a um valor médio de R$ 96,7 mil por processo. No Paraná, são 1.083 ações trabalhistas referentes à Covid-19 e os processos relacionados à doença ocupam o 13º lugar na lista das causas mais recorrentes.
O primeiro passo para as empresas que querem evitar ações judiciais é seguir à risca todos os protocolos de segurança ao mesmo tempo em que investe na conscientização dos seus funcionários, observou o advogado trabalhista Felipe Alcântara. Fornecer e incentivar o uso de máscara, de álcool gel e reforçar a importância de se manter o distanciamento adequado entre os profissionais por meio de campanhas internas de conscientização são formas de se proteger, assim como fiscalizar o funcionário e cobrar dele a adesão aos protocolos.
“Tem que incentivar as empresas a adotarem os protocolos de segurança e fazer a conscientização. É preciso educar o funcionário. Se o home office não for possível, é importante aumentar o distanciamento entre os trabalhadores no ambiente de trabalho. A gente tem empresas que foram recentemente fiscalizadas pelo Ministério Público do Trabalho e conseguiram demonstrar que cumpriam as normas sanitárias”, disse o advogado.
As notas orientativas emitidas pelo governo federal ajudam as empresas a contornarem algumas situações. A eficácia do uso de álcool gel para prevenção da disseminação da Covid-19, por exemplo, está expressa em um desses documentos. “Quando há um surto na empresa, fica mais fácil para os colaboradores comprovarem a origem da contaminação, mas em caso de reclamatória trabalhista ou fiscalização do Ministério Público do Trabalho, o juiz ou promotor vai conseguir se pautar pelas medidas que foram ou não adotadas”, destacou Alcântara. “A empresa, quando segue os procedimentos e tenta mostrar que está seguindo o caminho correto, faz o funcionário perder os argumentos. Quanto mais puder evitar uma ação judicial, melhor.”
“Estamos em uma nova realidade e as empresas precisam estar preparadas para enfrentá-la. Tem ocorrido vários processos na Justiça, vários casos aparecendo. As empresas precisam proteger as pessoas e se resguardar de passivos trabalhistas”, destacou a CEO da Local Confiável, Brunna Veiga. Além dos riscos à saúde dos funcionários e clientes, surtos de Covid-19 dentro da empresa podem causar danos também à imagem ou à marca e ficar suscetível a multas aplicadas por órgãos de saúde e fiscalização, destacou a CEO.
A start up dirigida por Veiga é uma empresa de certificação e monitoramento de normas e procedimentos, especialmente relacionados às questões sanitárias relacionadas à pandemia. A CEO entende que não há uma medida única para garantir a saúde dos funcionários e proteger as empresas de processos trabalhistas e o que funciona são várias ações adotadas em conjunto e comprovadas por documentação. “A empresa precisa ter alguém responsável por acompanhar as normas e regulações e criar ações para que os funcionários participem e desenvolvam a consciência do autocuidado e do cuidado com o outro.”
Veiga ressaltou ainda que para cada segmento de atuação da empresa há um protocolo específico e que o processo de adequação às normas sanitárias nem sempre é oneroso. “É possível adaptar com baixíssimo custo. Não precisa colocar acrílico em tudo, gastar com ar-condicionado. Mas o custo de ter o processo lá na frente, o custo de uma vida, é muito maior.”
DOENÇA OCUPACIONAL
Apesar de uma nota técnica publicada pelo governo federal em dezembro de 2020 esclarecer que a Covid-19 pode ser classificada como doença ocupacional, os tribunais do trabalho têm tomado o cuidado de analisar caso a caso, mas já há decisões da Justiça nesse sentido, com resultados favoráveis aos trabalhadores. Em São Paulo, o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região considerou a Covid-19 uma doença ocupacional em uma ação movida por trabalhadores dos Correios. O juiz baseou sua sentença na definição de que a estatal não tomou todas as medidas necessárias para prevenir a contaminação de seus funcionários.
Decisão semelhante ocorreu em Minas Gerais, onde a Justiça do Trabalho reconheceu que a morte por Covid-19 de um motorista funcionário de uma transportadora poderia ser enquadrada como acidente de trabalho e determinou que a empresa indenizasse a família da vítima em R$ 200 mil.
O caso mais emblemático até agora, no entanto, foi registrado em Rondônia. Em março, a Justiça do Trabalho de JiParaná determinou que um frigorífico deverá pagar R$ 20 milhões em indenização por danos morais coletivos após um surto de Covid-19 em uma unidade de bovinos da empresa, em São Miguel do Guaporé, cidade com cerca de 23 mil habitantes e que tem a indústria de alimentos como principal empregadora. Segundo a justiça local, empresa foi a principal fonte de contaminação e disseminação do novo coronavírus naquele município.
“Se os tribunais entenderem que a empresa deixou de seguir as normas sanitárias, a Justiça pode responsabilizar a empresa por uma eventual doença ocupacional”, disse o advogado trabalhista Felipe Alcântara.