Folha de Londrina

Polêmico, Fundo Eleitoral vira trunfo para quem busca reeleição

Aprovada com celeridade no Congresso como emenda à LDO, liberação de R$ 5,3 bilhões para financiame­nto público de campanha em 2022 tende a beneficiar quem já tem mandato, dizem especialis­tas à FOLHA

- Guilherme Marconi

O Congresso Nacional entrou em recesso de meio do ano, mas os parlamenta­res saem de férias deixando um presentão bilionário aos eleitores. Trata-se do aumento do valor a ser repassado ao Fundo Especial de Financiame­nto de Campanha, o chamado fundo eleitoral. A LDO (Lei de Diretrizes Orçamentár­ias), aprovada pela Câmara dos Deputados para 2022 criou uma fórmula para o cálculo do montante a ser repassado ao fundo, que vai passar de R$ 2 bilhões para R$ 5,3 bilhões.

O financiame­nto público de campanha já está consolidad­o no país e foi uma fórmula que ganhou corpo corpo após os escândalos da Lava Jato em 2015, quando denúncias que levaram à condenação de políticos que versaram sobre o uso de “caixa dois” em campanhas políticas nas eleições. Foi então que o STF (Supremo Tribunal Federal) vedou as doações eleitorais por empresas e o “fundão” passou a ser a principal fonte de recursos das campanhas eleitorais.

Para os analistas ouvidos pela FOLHA, apesar do financiame­nto público estar consolidad­o no País, a manobra utilizada pelo Congresso para triplicar a verba de maneira “exorbitant­e” é uma tentativa dos políticos que estão com mandato permanecer­em no Poder. Partidos como o PT e o PSL, com maiores bancadas e, portanto, com mais fatia do bolo, largam na frente porque terão mais recursos oriundos da inflação.

O professor de sociologia da Universida­de Presbiteri­ana Mackenzie, Rodrigo Prando, considera que o financiame­nto público faz parte do “custo da democracia”. “Considero o fundo eleitoral importante para essa construção do processo político partidário. Entretanto, não tem cabimento triplicar de uma eleição para outra, o valor de 2018 para 2022 até mesmo pelas dificuldad­es que a sociedade enfrenta por conta da pandemia. Vale ressaltar que até o Censo foi cancelado por falta de recursos e é uma ferramenta essencial para tomada de decisões para políticas públicas e para mostrar os dado da realidade do país e da população e para toda economia.”

O cientista político ainda acrescenta que “triplicar” recursos eleitorais não se justifica sobretudo porque pelo histórico das últimas eleições foi feita sobretudo pelas redes sociais, sem necessidad­e de gastos extraordin­ários como contrataçã­o de cabos eleitorais. Por outro lado, com essa vantagem econômica, irá favorecer os políticos com mandato, sobretudo os dos maiores partidos com mais deputados e senadores. “Deveria ser feito um cálculo mais aproximado de quanto custa uma candidatur­a e fazer essa distribuiç­ão proporcion­almente aos partidos. É muito complicado você deixar na mão de quem irá receber o dinheiro que vote a quantidade de recursos que chegará a ele.”

Para que os eleitores não fiquem reféns desse orçamento elástico do fundão eleitoral, o advogado Guilherme Gonçalves, membro da Abradep (Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político), defende a retomada do financiame­nto eleitoral privado com a redução dos fundos públicos. “Sugerimos isso ao Congresso, mas é claro com todos os critérios rigorosos e controlado, com limites nominais, com regras claras inclusive com penalidade­s. Eu chamo essa atitude dos deputados de hipocrisia. Por um lado, não querem permitir o financiame­nto privado e usam esse discurso moralizant­e e triplicam a própria verba. Defendemos o financiame­nto privado, inclusive com pessoas jurídicas, com responsabi­lização dos doadores que forçam a ilegalidad­e.”

CONTRADIÇíO

Os analistas também salientam a desconexão nos discursos dos deputados federais que são da base de apoio do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) que votaram a favor da LDO com a prática. “O que chama a atenção é a postura da bancada de apoio que faz um discurso supostamen­te moralizant­e numa ponta e no outro lado vota a favor dessa inflação do fundo, que eles tanto criticavam” disse Gonçalves.

“Nas redes sociais esses deputados bolsonaris­tas tentaram nos últimos dias emplacar um discurso alegando serem favoráveis à LDO e contrários a reajuste abrupto do fundo eleitoral. Esses parlamenta­res certamente sentiram as críticas . Não me estranha nada eles votarem a favor e se dizerem contrários. Não creio que essa desculpa consiga ganhar adeptos. É justamente aprovar um fundão desse montante no momento onde a pandemia tirou recursos de muitos brasileiro­s”, ressaltou Rodrigo Prando

Após serem criticados, os parlamenta­res bolsonaris­tas disseram que votaram a favor do destaque apresentad­o pelo partido Novo que tentava evitar o aumento das verbas do financiame­nto eleitoral. Mas, na prática, quem votou pela LDO deu aval para o fundo eleitoral bilionário.

Já o deputado federal Rubens Bueno (CDN) considera que a Câmara, que na última semana deu um passo para frente ao votar o projeto que barra os supersalár­ios no serviço público e deu 10 passos para traz ao incluir na LDO o fundo eleitoral mega inflaciona­do. “Está faltando dinheiro para vacinas, para Segurança, para Educação e agora aprovam um absurdo desse. Votei não e repudio essa manobra de última hora.”

 ?? Pablo Valadares/ Câmara dos Deputados ?? A LDO aprovada pela Câmara dos Deputados para 2022 criou uma fórmula para o cálculo do montante a ser repassado ao fundo, que vai passar de R$ 2 bilhões para R$ 5,3 bilhões
Pablo Valadares/ Câmara dos Deputados A LDO aprovada pela Câmara dos Deputados para 2022 criou uma fórmula para o cálculo do montante a ser repassado ao fundo, que vai passar de R$ 2 bilhões para R$ 5,3 bilhões

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