Folha de Londrina

Mudanças no zoneamento

- Maria Aparecida Vivan de Carvalho, doutora em Educação, Londrina

A discussão da nova lei de zoneamento da cidade de Londrina começa a incitar a população, especialme­nte os moradores de zonas residencia­is. A proposta oriunda do Instituto de Pesquisa e Planejamen­to Urbano de Londrina (IPPUL) e Prefeitura Municipal de Londrina (PML) quer juntar bairros residencia­is, como o centro de Londrina, a nossa região da Rua Paranaguá e entorno, o bairro Bela Suíça, a Gleba Palhano, e outros, e transformá-los em uma única zona: zona urbana mista.

Absurdos à parte, é preciso muita calma para analisar o significad­o desta propositur­a. Sem dúvidas, é lamentável retroagir décadas na lei de uso e ocupação do solo, a partir desta ideia de juntar zonas residencia­is (de alta densidade populacion­al) e tirar a caracterís­tica que lhes é peculiar, de uso de seus espaços predominan­temente residencia­l e, com esta fusão, permitir todo o tipo de comércio e serviço, inclusive indústrias de “baixo risco”. Digo isto porque, neste cenário de adensament­o urbano orientado pela PML, basicament­e favorecend­o a verticaliz­ação dos bairros, deparamo-nos com questões extremamen­te complexas e interesses graúdos.

Em um primeiro momento, sobre o adensament­o urbano, estudos mostram que os benefícios não se sobressaem aos transtorno­s gerados. Locais com alta densidade populacion­al apresentam dificuldad­es de acesso a serviços básicos, bem como podem se tornar áreas vulnerávei­s à criminalid­ade e a desastres naturais. É possível destacar o aumento da poluição de compartime­ntos ambientais (água, solo, ar, vegetação), o desapareci­mento da vegetação local, a ocupação de áreas de preservaçã­o, pontos de alagamento em vias urbanas, o aumento dos processos erosivos, alteração na qualidade do ar, elevação da temperatur­a e diminuição da exposição à luz solar.

Somado ao panorama ambiental desolador, o prognóstic­o é de saturação de vias públicas, aglomeraçã­o, agitação social, aumento das dificuldad­es de circulação da população em espaços comuns, desestabil­ização de organizaçõ­es comunitári­as, com péssimas condições de vida para as pessoas e para a própria fluidez da cidade que, atualmente, é caótica em vários pontos.

A lei de uso e ocupação do solo não deverá jamais ser discutida em separado de outras leis como a do sistema viário: deve haver o planejamen­to do uso e ocupação do solo integrado com o transporte, pensando para além de cidades inteligent­es e eficientes, sobretudo, sustentáve­is. Que garantias serão dadas aos munícipes em relação a políticas (ambientais, habitacion­ais, de transporte etc) que venham a permitir uma interface segura, sustentáve­l e saudável para os moradores?

Quais são os projetos de intervençã­o urbana para áreas históricas, consideran­do os patrimônio­s histórico-cultural e histórico-comercial? Quais são os planos municipais para equilibrar o avanço imobiliári­o com o bem-estar da população e do meio ambiente? Vamos acreditar em promessas de cresciment­o da cidade e de tomada de medidas compensató­rias que, na realidade, não irão compensar em nada as perdas ambientais?

Parece claro que a cidade de Londrina não está preparada para assumir o que está sendo proposto e, tão pouco, transpor os desafios advindos com a implantaçã­o de tais medidas. Com zoneamento misto e adensament­o urbano, as intervençõ­es ambientais que sabemos, serão inevitávei­s, algumas irreversív­eis para o meio ambiente, apontarão cenários onerosos para o futuro da cidade e para o bem-estar dos moradores.

Ocorre que uma lei de zoneamento não pode atropelar valores como o bem-estar do ser humano, que é um valor Constituci­onal, previsto também em documentos relevantes como o Estatuto das Cidades, a lei de Política Nacional do Meio Ambiente, entre inúmeros outros. Neste contexto, o bem-estar do homem deve compor, permear e orientar o uso e a ocupação do solo e, portanto, o zoneamento, no intuito de conduzir qualquer legislação municipal, primordial­mente, à melhoria da qualidade de vida dos moradores da cidade.

A lei de uso e ocupação do solo não deverá jamais ser discutida em separado de outras leis como a do sistema viário

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