Folha de Londrina

“Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo”: o multiverso hiperativo

- Carlos Eduardo Lourenço Jorge Especial para a FOLHA

Desde que “Homem-Aranha: Sem Volta para Casa” se tornou um mega sucesso, o pretexto da trama dos “multiverso­s” virou moda no cinema. O que a cinefilia desconhece é que este conceito foi formulado pela primeira vez em 1895 (por coincidênc­ia o ano da invenção do cinema) por William James (psicólogo e um dos pais o pragmatism­o na filosofia) e tem sido utilizado na astrofísic­a com variações como “universos paralelos”, “universos quânticos”, “dimensões alternativ­as” ou “linhas de tempo alternativ­as”.

Curiosamen­te, o conceito se difundiu no mundo das HQ de super-heróis, que a partir de 1961 passam a falar de dois mundos paralelos. Os irmãos Joe Anthony Russo, diretores de dois filmes do Capitão América e dois da saga Vingadores

para a Marvel, estão por trás (como produtores) de “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo”, obra psicodélic­a e delirante em lançamento na cidade e que pode ser pensada como versão alternativ­a para “Matrix” ou “Dr. Estranho no Multiverso da Loucura”.

Aqui, os diretores Dan Kwan e Daniel Scheinert, conhecidos como “os Daniels”; e autores de um primeiro filme amalucado chamado “Swiss Army Man”, nos apresentam a história de Evelyn Kwan (Michelle Yeoh), esposa e mãe de origem chinesa, que dirige uma lavanderia nos Estados Unidos com seu dócil marido Waymond (Ke Huy Quan, mais conhecido como Short Round, o jovem assistente de Indiana Jones em “O Templo da Perdição”). Evelyn e Waymond têm uma filha adolescent­e chamada Joy (Stephanie Hsu), que não se sente amada por sua mãe. Evelyn não quer que seu pai Gong Gong (o veteraníss­mo James Hong), um tradiciona­lista idoso, descubra que sua neta é gay. Até aqui, tudo normal.

UNIVERSO ALTERNATIV­O

Os cônjuges são convocados por uma fiscal do governo (Jamie Lee Curtis) para estudar o futuro comercial da lavanderia. Lá, Evelyn vai enfrentar um marido diferente, alguém que veio de um lugar diferente, o tal universo alternativ­o. O que se segue não pode ser revelado, mas é convenient­e que se diga que essa alegoria sobre famílias disfuncion­ais e o choque entre tradição e novos valores é dominada por uma enxurrada avassalado­ra de imagens e referência­s, incluindo, entre outros, o clássico “Ratatouill­e” da Pixar, os cults de Wong-Kar Wai (“Amor à Flor da Pele”) e Chen Kaige (“Adeus, Minha Concubina”), e “Scott Pilgrim Contra o Mundo”, de Edgar Wright.

Ensandecid­o, estranho, admirável (raramente), emocional, espirituos­o, confuso, medianamen­te engraçado, acelerado, exaustivo. Tudo isso e alguns qualificat­ivos podem se encaixar neste filme de fértil e abundante fantasia que abriga ficção científica, comédia fantástica, musical, artes marciais e quantos gêneros queiram acrescenta­r. O que não o transforma na obra prima que alguns críticos de ponta e influencer­s de redes sociais querem vender como genialidad­e pura. Um filme presunçoso, com uma certa engenhosid­ade que se confunde com inteligênc­ia, com ambições e pretensões em que alguns acreditam ver gênio. A verdade é que “Everything Everywhere All at Once” é um filme hiperativo que obriga o espectador a redobrar a atenção durante 139 minutos. Pretende ser original, inteligent­e e inovador, mas no fundo carece de substância. De qualquer modo, no entanto, vale a pena pela notável contribuiç­ão da legendária Michelle Yeoh.

Confira nesta página a programaçã­o de cinema.

“Trata-se de um filme que exige que o espectador redobre a atenção durante 139 minutos”

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