Congresso tem forte presença oposicionista, mas projetos são de interesse público
O presidente, contudo, encontrará um Congresso com forte presença oposicionista. Diversos políticos ligados a Bolsonaro se elegeram senadores e deputados federais. Ao Senado, por exemplo, chegam os exministros bolsonaristas Sergio Moro (União-PR), Tereza Cristina (PP-SP), Rogério Marinho (PL-RN), Marcos Pontes (PL-SP) e Damares Alves (RepublicanosDF), além do ex-vice-presidente Hamilton Mourão (Republicanos-RS).
A eleição do ano passado transformou o PL, partido do ex-presidente, na sigla mais numerosa do Senado, com 14 representantes (17% do total). O PT, do presidente Lula, tornou-se a quinta maior bancada da Casa, com nove senadores (11% do total).
Diante dessa composição, o senador oposicionista Carlos Viana prevê inúmeros embates no Parlamento entre base governista e oposição. “O radicalismo que tomou conta da última eleição, com essa divisão entre direita e esquerda, vai aparecer bastante nesta nova legislatura porque ainda não apareceu uma liderança de centro capaz de aglutinar o meio político e trazer um novo pensamento para os dois lados.
Viana afirma que os confrontos devem aparecer na discussão legislativa da nova âncora fiscal: “Houve uma luta muito grande para que conseguíssemos o teto de gastos. Foi quebrado no governo Bolsonaro por força da pandemia, mas está sendo quebrado agora no governo Lula por questões político-partidárias e de assistência social. Não que isso seja ruim, mas é preciso ter responsabilidade com o gasto público. Entendo que a reforma tributária sairá [com facilidade], mas a nova âncora fiscal exigirá muito mais discussão e negociação”.
O senador também prevê embates na pauta conservadora. “A liberação do aborto e das drogas, tema que a esquerda sempre usou para nos provocar, não vai avançar no Congresso. Prevejo que isso vai gerar muita manchete nos próximos quatro anos. Como integrante da bancada evangélica, eu vou estar permanentemente vigilante na defesa da vida e da família.”
O senador governista Humberto Costa discorda. “Lula é um presidente que procura unir e aglutinar, e não provocar confronto. O governo vai priorizar projetos que são do interesse da população.”
Os analistas avaliam que essa pauta não será a prioridade do governo Lula e creem que a oposição terá dificuldade para se impor no Congresso. “A oposição vai ser estridente, mas não necessariamente vai ter maioria para criar grandes problemas para o governo. Ela deve ficar restrita à ala mais radical do bolsonarismo”, diz o cientista político Cláudio Couto, da FGV.
“A oposição mais radicalizada deverá mais jogar para a plateia com temas polêmicos do que fazer um debate sobre as políticas públicas”, acrescenta o cientista político João Feres Júnior. “Além dessa oposição, existe outra no Congresso, uma direita institucional, que muitas vezes não concorda com as políticas públicas do PT, mas costumar estar aberta para, em nome dos interesses nacionais, conversar e negociar pontos específicos.
CPI
Os dois cientistas políticos acreditam que o presidente Lula agiu corretamente ao não apoiar uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) para investigar os atos golpistas do dia 8 de janeiro, que culminaram com a invasão e depredação dos prédios do Palácio do Planalto, do Congresso Nacional e do
Supremo Tribunal Federal.
“Uma CPI só faz sentido quando o Executivo, o Ministério Público e o Judiciário se omitem. No caso dos atos golpistas, isso não ocorreu”, afirma Feres Júnior.
“As CPIs são buracos negros que têm o poder de sugar toda a energia que existe ao seu redor. Se o governo entrasse numa CPI dos atos golpistas, certamente perderia a energia necessária para aprovar os projetos que neste momento são prioritários para o Brasil. Seria contraproducente”, acrescenta Couto.
No entender do senador Humberto Costa, uma CPI desse tipo só interessa à oposição. “O governo precisa de um ambiente de tranquilidade para implementar suas políticas. De qualquer forma, caso as investigações que estão em curso não avancem e os golpistas e seus financiadores não sejam responsabilizados, o Congresso pode entender que é necessário abrir uma CPI para evitar a impunidade.”