Calorão fez as plantas `cozinharem´ no campo
O secretário da Agricultura e do Abastecimento do Paraná, Norberto Ortigara, conta que as plantas “cozinharam” no norte paranaense, quando os termômetros giravam em torno de 40°C na segunda quinzena de dezembro. “Foram calorões de 36°C a 40°C no ambiente, e 50°C a 55°C no meio da lavoura. Não tem planta que resista”, diz.
“Quando é um veranico normal, sem temperatura muito alta, a lavoura resiste 15, 20 dias sem chuva. Mas, com temperatura muito alta, começou a ter impacto negativo”, completa Flavio Turra, gerente de Desenvolvimento Técnico e Econômico da Ocepar (Sindicato e Organização das Cooperativas do Paraná).
Entidades como a Ocepar estão pleiteando junto ao governo federal a prorrogação de pagamentos ligados ao custeio da safra. Além das perdas no plantio, Turra afirma que o preço baixo da soja hoje é mais um fator negativo. “A saca está na faixa de R$ 105, R$ 110. Colhe pouco e ainda tem preço baixo”, queixa-se.
IRRIGAÇÃO E SEMENTES RESISTENTES
Para o pesquisador Reinaldo Silveira, do Simepar (Sistema de Tecnologia e Monitoramento Ambiental do Paraná), o agricultor vai precisar de um outro olhar daqui para frente.
“Não é só mais o El Niño, que sempre aconteceu e sempre se estabelece entre as décadas. Existe a questão do aquecimento global. Então tem que pensar mais no ecossistema, no que a monocultura interfere nisso, na falta de diversidade”, ressalta.
“Mas, claro, as pessoas não se mobilizam da noite para o dia. Quando é uma coisa de ano a ano, o agricultor às vezes prefere ter o prejuízo e depois a recuperação do que se mobilizar e mudar completamente”, avalia.
No Paraná, produtores rurais não estão acostumados com irrigação, um sistema implantado em apenas 1% das propriedades. “O Paraná sempre teve um regime de chuva bastante razoável”, justifica o secretário.
Turra, da Ocepar, acrescenta que a irrigação é cara e que, historicamente, o custo-benefício não é favorável ao produtor rural do Paraná.
“No futuro, se a coisa se agravar, pode ser que haja a ampliação da irrigação”, opina.
Mas outras alternativas estão sendo estudadas diante da crise climática, como o desenvolvimento de sementes ainda mais resistentes ao calor.
“Há um esforço de órgãos de pesquisa para eventualmente gerar materiais mais tolerantes ao estresse hídrico. A própria Embrapa [Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária] trabalha com uma linha de pesquisa para gerar novas variedades de soja que possam enfrentar períodos mais longos de falta de água. Mas é um trabalho de mais longo prazo”, cita Ortigara.
Turra e o secretário da Agricultura acrescentam que algumas práticas, como o plantio direto, por exemplo, podem ajudar no calorão. O plantio direto, quando não há remoção da vegetação residual da lavoura anterior, conserva a umidade no solo.
“Um passo importante é refinar o processo de plantio direto de qualidade, fazer uma boa ‘palhada’ para proteger o solo. O outro passo é progressivamente começarmos a usar de forma racional a irrigação como método de produção, de preferência com água guardada. Enquanto não vêm as plantas mais resistentes e tolerantes”, defende o secretário.