Aos 40 anos, Metrô busca independência do governo
Medida é defendida pelo presidente da companhia, que registra prejuízo
Empresa receberia por número de passageiros e não de acordo com o valor da tarifa, que está congelada desde 2012
O Metrô completa 40 anos de sua primeira viagem no próximo dia 14 em busca independência do governo.
Com dificuldade de aumentar o número de funcionários e receitas em queda devido ao congelamento da tarifa, técnicos e o atual presidente da companhia defendem mais autonomia.
No atual modelo, a operação do Metrô é bancada basicamente com venda de passagens. Com a mudança, a empresa teria um contrato com o Estado e receberia segundo o número de passageiros transportados, como já ocorre com as concessionárias privadas.
Assim, sua receita seria independente da decisão política sobre a tarifa — que teve alta revogada após os protestos de junho do ano passado e está congelada em R$ 3 desde 2012. A inflação acumulada desde então foi de 16%.
O presidente do Metrô, Luiz Antonio Pacheco, que assumiu a empresa no mês dos protestos, diz que já discute o tema com a equipe econômica da gestão Geraldo Alckmin ( PSDB).
“Em algum momento, o Estado vai ter que fazer um novo tipo de arranjo com o Metrô. Acho que é do interesse do Estado ter um contrato de gestão”, afirma. O novo modelo implica a possibilidade de subsídio do governo ao Metrô, que não existe hoje.
Em 2013, a empresa teve prejuízo de R$ 76,4 milhões, mais que o dobro do ano anterior. Pacheco diz que cortou custos para manter a operação, mas o limite é o ano que vem. “Neste ano de 2015, se não tiver aumento [ de receita], teremos problema. Ou ele vem via aumento de tarifa ou o sistema vai arrumar outro mecanismo”, diz.
O dirigente diz que a mudança aumentaria a responsabilidade do Metrô.
“Tem que ter outro acordo, por um lado [ o governo] dar mais autonomia para a empresa e, por outro lado, poder cobrar”, afirma. NOVO PAPEL Segundo Pacheco, o plano de expansão prevê que o metrô chegue a 2030 com cerca de 250 km — ainda aquém da extensão das redes de cidades como Londres ( 402 km) e Nova York ( 368 km).
Para atingir essa meta, o Metrô terá que imprimir ritmo inédito, já que foram 40 anos para chegar à malha atual, de 78 km — média inferior a 2 km novos por ano.
O administrador diz que haverá cada vez mais ajuda da iniciativa privada, já que a tendência é que todas as novas linhas sejam concessões. Com isso, a companhia deverá se concentrar principalmente na coordenação do transporte subterrâneo.
Em setembro de 1974, houve festa e modelos para receber usuários; nova linha ia da Vila Mariana ao Jabaquara
Quando José Augusto andou de metrô pela primeira vez, aos 13 anos, esperava que ele fosse um dia passar perto de sua casa, em Campo Belo, na zona sul. Já Marcelo, aos 12, teve de explicar aos amigos que o túnel não cairia sobre sua cabeça.
Eles estavam entre as poucas crianças que participaram da inauguração da operação comercial do Metrô de São Paulo, emsetembro 1974.
Quarenta anos depois, convidados pela Folha, eles refizeram a viagem. Hoje, dizem não usar mais o transporte.
“Eu estava fascinado com a modernidade, para mim aquilo era o progresso chegando”, diz José Augusto Aly, 53. Professor de arquitetura do Mackenzie, ele avalia que o metrô não cresceu no ritmo que deveria e cobra investimentos em expansão.
Já Marcelo Godoy, 52, que teve dois filhos e se tornou dono de um restaurante, teve de driblar autoridades e convidados para poder andar de metrô em paz.
“No dia, estava uma confusão: um monte de gente e políticos. Eu estava com o meu avô, que trabalhou nas obras, e lembro que queria fotografar tudo com uma máquina Kodak da minha irmã”, lembra. Infelizmente, ele conta, as fotos de sua câmera saíram todas queimadas.
PRIMEIRO DIA
Se tivesse funcionado naquele dia, a máquina de Marcelo guardaria cenas improváveis de se ver hoje. Entre elas, um exército de modelos que recepcionavam os passageiros vestidas de camisas azuis, calças brancas no modelo boca de sino e chapelões com fitas azuis.
Além disso, nas ruas, fanfarras e corais de crianças aguardavam os viajantes nas saídas das estações do primeiro trecho inaugurado ( entre Vila Mariana e Jabaquara, na linha 1- azul).
Naquela época, um dispositivo sobre a catraca perfurava os bilhetes que custavam o equivalente a R$ 0,84 ( valor reajustado pelo IPC- Fipe). Caso o passageiro tentasse furar duas vezes o mesmo bilhete, a catraca não era liberada.
Apesar da aparente fragilidade do sistema, eram poucas as tentativas de fraudes.
“Antigamente, o bilhete não era magnético, era apenas um pedaço de cartolina, e a gente não tinha problemas com falsificação”, diz Nelson Medeiros Sobrinho, que trabalha há 40 anos na empresa.
Sobrinho atua como gerente de operações financeiras, mas começou a carreira na companhia tentando convencer o público a andar nos trens da companhia.
“OMetrô não foi umsucesso instantâneo. Com o tempo, as pessoas tiveram que ser convencidas de que poderiam usá- lo cotidianamente, de que era seguro e funcional”, afirma ele.
Para que isso acontecesse, a empresa precisou até distribuir bilhetes gratuitamente e fazer excursões escolares pelas estações e trens.
Hoje, tanto José Augusto quanto Marcelo usam carros, mas cobram a expansão da rede para poderem usar frequentemente os vagões.