Folha de S.Paulo

Causa surpresa ver Isabelle Huppert em romance bobo

- ANDRÉ BARCINSKI é jornalista e diretor do programa “O Estranho Mundo de Zé do Caixão”, no Canal Brasil

Nenhuma lista das atrizes mais marcantes e talentosas do cinema nos últimos 40 anos estaria completa sem a francesa Isabelle Huppert.

Seu currículo é excepciona­l: desde sua estreia nas telas, em 1971, trabalhou com cineastas de peso como Godard, Chabrol, Tavernier, Bellochio, Haneke, Raúl Ruiz, Blier, Claire Denis e os irmãos Taviani, entre outros.

Sempre fez filmes fortes e pessoais e, diferentem­ente de outras grandes “damas” do cinema europeu, não parece tentada a faturar em Hollywood ( como é triste ver Helen Mirren em “Red - Aposentado­s e Perigosos”, não?).

Por isso, é uma surpresa ver Huppert numa comédia tão boba quanto “Um Amor em Paris”.

Para quem matava uma família na bomba atômica “Mulheres Diabólicas” ( 1995), de Chabrol, ou se mutilava no delírio sadomasoqu­ista de “A Professora de Piano”, de Michael Haneke, ver a atriz em umpapel que parece feito sob encomenda para Meg Ryan é, no mínimo, estranho.

Em “Um Amor em Paris”, Huppert faz Brigitte, esposa de um criador de vacas, Xa- vier ( Jean- Pierre Darroussin).

O casal vive no interior da França e leva uma vida simples, “abrilhanta­da” por fins de semana em competiçõe­s de beleza de bovinos, onde Xavier exibe seus bichinhos.

Mais que entediada, Brigitte parece anestesiad­a pela monotonia do cotidiano.

Tudo muda quando ela vai a uma festa na casa de um vizinho e conhece Stan ( Pio Marmai), que flerta com ela. Stan mora em Paris, e Brigitte, num impulso, arruma uma desculpa para ir à Cidade Luz procurar o galãzinho.

Xavier, sentindo que algo mudou no comportame­nto sempre plácido da esposa,

O QUE HUPPERT ESTÁ FAZENDO AQUI, TÃO FORA DE SUA LIGA? O QUE VEM AGORA? DREW BARRYMORE NO PAPEL DE UMA NINFOMANÍA­CA ASSASSINA NUM FILME DE LARS VON TRIER?

acaba seguindo- a.

Stan desperta em Brigitte sensações que ela julgava mortas, e a viagem a Paris simboliza uma tentativa de reviver algo que o cotidiano do casamento anestesiou. CARTÃO- POSTAL Não há nada particular­mente errado com o filme. É mais uma dessas comédias românticas sobre crises de meia- idade e a busca pelo tempo perdido.

A capital francesa, como acontece em todos os filmes desse tipo, é mostrada como eterno cartão- postal, lugar idílico e romântico, em contraposi­ção à chatice da vida interioran­a de Brigitte e Xavier.

A pergunta é: o que Isabelle Huppert está fazendo aqui, tão fora desualiga? O quevem agora? Drew Barrymore no papel de uma ninfomanía­ca assassina num filme de Lars von Trier ou Michael Haneke?

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