Governo anuncia rombo ‘variável’, que pode ir a R$ 103 bi neste ano
Deficit público de R$ 51,8 bilhões não inclui o pagamento das chamadas pedaladas fiscais
No pior cenário, deficit vai a 1,78% do PIB; equipe econômica prevê retração da economia de 2,8% neste ano
O governo oficializou nesta terça-feira (27) que, pelo segundo ano consecutivo, não vai economizar para pagar juros de sua dívida. Depois de prometer fechar 2015 no azul, jogou a toalha e admitiu que a União deve registrar um deficit primário de R$ 51,8 bilhões no final do ano, equivalente a 0,9% do PIB (Produto Interno Bruto).
Em um cenário pessimista, mas possível, o rombo do governo central pode quase dobrar, indo para R$ 103,1 bilhões (1,78% do PIB).
Motivo: o cálculo do deficit não incluiu o pagamento do passivo das pedaladas fiscais, estimado em R$ 40,2 bilhões, e conta ainda com a entrada incerta de R$ 11,1 bilhões do leilão de 29 usinas previsto para o mês que vem.
Relator da mudança na meta, o deputado Hugo Leal (Pros-RJ), alertou para essa possibilidade. “Se o leilão das usinas fracassar e o governo tiver de quitar todo o passivo das pedaladas fiscais, o deficit será maior”, afirmou, após reunião com o ministro Nelson Barbosa (Planejamento).
Já prevendo esse risco, o governo incluiu no texto de mudança da meta enviado ao Congresso uma cláusula destacando que o resultado primário poderá ser modificado se o dinheiro do leilão das usinas não entrar no caixa e de acordo com o que terá de ser quitado das pedaladas fiscais ainda em 2015.
O leilão já foi adiado do dia 6 de novembro, conforme a Folha antecipou, para o final do mês porque uma medida provisória sobre o assunto ainda não foi aprovada, gerando insegurança jurídica. O setor não descarta novo adiamento ou que nem todos os lotes sejam leiloados.
Em relação às pedaladas fiscais, passivos do Tesouro com bancos públicos, o TCU (Tribunal de Contas da União) deve tomar uma decisão apenas no final de novembro, quando pode determinar que o pagamento seja parcelado ou feito de uma só vez.
A Fazenda prefere parcelar a dívida para evitar que o tamanho do rombo ganhe, como definem assessores presidenciais, “proporções gigantescas” e leve a nova perda do grau de investimento. Já o Planejamento não descarta o pagamento total, para limpar o Orçamento de 2016. RETRAÇÃO DE 3% Antes do anúncio, em São Paulo, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, responsabilizou a queda na atividade econômica pelo deficit neste ano.
“Tivemos sucessivas revisões do crescimento do PIB e, com isso, também sucessi-
Início do ano Cenário 1 Deficit assumido pelo governo nesta terça com queda na arrecadação Cenário 2 Rombo do governo central pode chegar a R$ 62,9 bilhões, equivalente a 1,09%, se leilão de usinas fracassar Cenário 3 Deficit pode saltar para R$ 103,1 bilhões, ou 1,78% do PIB, se leilão fracassar e governo pagar todo passivo das pedaladas vas e drásticas reduções das receitas”, afirmou. O efeito do contingenciamento promovido pelo governo ficou, portanto, limitado, disse.
No texto enviado ao Congresso, a equipe econômica projeta queda de 2,8% no PIB em 2015, ante previsão de 2,4% em setembro.
De acordo com Levy, o governo fez neste ano o “maior contingenciamento da história, de R$ 80 bilhões”. “Para quem gosta dessa metáfora shakespeariana de cortar na carne, nós cortamos na carne. Mas, com a evolução da economia, há necessidade de reavaliar a meta”, disse. SEM SURPRESA Para a agência de classificação Moody’s, a revisão não surpreendeu. Ainda assim, “corrói a já fraca credibilidade fiscal do governo e ameaça enfraquecer ainda mais a confiança doméstica”, disse, em nota. A agência ressaltou, contudo, que as revisões não sinalizam mudança na posição de austeridade fiscal defendida pelo governo.
“O mais importante é sinalização de longo prazo, mais do que apresentar superavit neste ano”, disse o ex-secretário do Ministério da Fazenda e atual diretor do Centro de Cidadania Fiscal, Bernard Appy. “Quanto mais críveis as medidas de longo prazo, menos pressão para apresentar resultado no curto prazo.” (VALDO CRUZ, ISABEL VERSIANI, DIMMI AMORA, GIULIANA VALLONE E RENATA AGOSTINI)