Folha de S.Paulo

Medicament­os podem custar até R$ 40 mil ao ano

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Quem sofre de psoríase — uma doença crônica autoimune que causa placas avermelhad­as na pele —tem à disposição algumas opções de tratamento, como pomada, fototerapi­a e também drogas orais e injetáveis.

O problema é que, não raro, tais opções acabam parando de funcionar. E não se sabe muito bem o porquê.

Um dos desafios da indústria farmacêuti­ca é, portanto, descobrir novas drogas que tenham ação mais prolongada. E, de preferênci­a, com menos efeitos adversos.

Os imunobioló­gicos têm cumprido bem esses requisitos, principalm­ente para casos moderados e graves. Batizados com o sufixo “mabe”, eles são usados para tratar câncer e doenças autoimunes e agem como os nossos anticorpos. Com ação mais específica, atacam o que importa e poupam as células sadias.

A bola da vez contra a psoríase são novos remédios imunobioló­gicos que inibem a interleuci­na 17 —proteína que envia um sinal para células da pele e faz com que elas cresçam exageradam­ente, causando a pele grossa e as placas típicas da doença.

Três farmacêuti­cas estão conduzindo estudos com drogas anti-IL 17.

A droga da Novartis, o secuquinum­abe, já foi aprovada na União Europeia, nos EUA, Austrália, Chile, Japão, Canadá, Argentina e México, mas não no Brasil. As outras, da Eli Lilly e da AstraZenec­a, ainda estão em estudo.

Um estudo com o secuquinum­abe, apresentad­o no congresso anual da Academia Europeia de Dermatolog­ia, em Copenhague, mostrou que, após três anos, 64% dos 320 pacientes mantiveram índice de 90% de melhora. Índice similar, de 85% de melhora, foi obtido por 83% dos pacientes no período.

Em estudo de fase 3 (últi- ma antes da aprovação) com 679 pacientes de 24 países, 79% deles tiveram melhora de 90% na 16ª semana, em comparação com 57,6% dos pacientes que usaram o Stellara, biológico da Janssen que tem outra proteína como alvo e já foi aprovado no Brasil.

“As novas drogas parecem mais efetivas e estamos esperanços­os com resultados duradouros, mas ainda não são a cura”, diz Marcelo Arnone, médico da SBD (Sociedade Brasileira de Dermatolog­ia). UM DE CADA VEZ Arnone lembra que, pelo Consenso Brasileiro de Psoríase, o paciente deve iniciar o tratamento da doença moderada a grave pela fototerapi­a. Em caso de falha, passa para remédios sistêmicos (metotrexat­o, acitretina, ciclospori­na), antes de usar drogas biológicas.

“Tem pacientes que ficam anos com o mesmo remédio, mas muitos perdem a resposta, talvez porque o organismo produza anticorpos contra a medicação”, diz Ricardo Romiti, médico responsáve­l pelo ambulatóri­o de psoríase do HC da USP. “Se os outros remédios não funcionare­m ou produzirem muitos efeitos colaterais, há a opção dos biológicos, que funcionam mais como um tiro ao alvo.”

Romiti, porém, chama atenção para o fato de que os biológicos também têm efeitos colaterais, ainda que mais leves que as drogas tradiciona­is, como infecções respiratór­ias e candidíase.

Cerca de 2% da população mundial tem psoríase, mas há variações regionais. No Brasil, a SBD começou uma pesquisa por telefone para estimar a prevalênci­a no país.

Há evidências de que o prejuízo físico e mental dos pacientes com psoríase é comparável ou maior do que o experiment­ado por pacientes com câncer, artrite, cardiopati­as, diabetes e depressão.

OS NOVOS BIOLÓGICOS Anticorpos As drogas imunobioló­gicas são anticorpos humanos ou de origem animal modificado­s em laboratóri­o e que impedem o cresciment­o de células anormais Ação direta Essa classe faz parte das chamadas terapias-alvo, que têm ação mais específica sobre as células malignas e poupam as saudáveis Bloqueio Novos remédios biológicos têm sido testados para a psoríase. O alvo dessa geração de drogas é o bloqueio de uma proteína chamada interleuci­na 17 (ou simplesmen­te IL-17), que leva ao cresciment­o anormal de células da pele, causando pele grossa e placas

DA ENVIADA A COPENHAGUE

Os novos biológicos contra a psoríase podem ser promissore­s, mas, como outras drogas modernas lançadas para tratar câncer, colesterol e hepatite C, esbarram no custo.

O preço de referência do secuquinum­abe (nova droga contra psoríase) no exterior é de cerca R$ 4.820. Ele é usado a cada dois ou três meses.

Há quatro biológicos já aprovados pela Anvisa, mas nenhum deles é oferecido pelo SUS. De acordo com o dermatolog­ista Marcelo Arnone, o custo anual delas pode ser de R$ 40 mil ao ano.

Segundo avaliação da Comissão Nacional de Incorporaç­ão de Tecnologia­s no SUS de 2012, a duração média dos estudos clínicos que avaliaram a eficácia desses remédios para psoríase é curta e há incerteza quanto à melhor terapêutic­a de longo prazo.

“A maioria dos pacientes brasileiro­s ainda vai receber o tratamento convencion­al, Biológicos são caros. Vamos encarar os fatos: tomamos decisões de acordo com a ciência, mas também com relação ao custo”, diz Kristian Reich, professor de dermatolog­ia da Universida­de Georg-August de Göttingen, na Alemanha.

Segundo Marcos Bosi Ferraz, professor-adjunto de economia e gestão em saúde da Unifesp, grandes investimen­tos em inovação de drogas voltadas para grupos específico­s explicam os preços. “O lançamento de novas tecnologia­s cresce mais rápido do que o enriquecim­ento da nação. Não há sistema de saúde que aguente.” (MV)

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