Folha de S.Paulo

Em 2011, Brasil seria potência, cão fazia ofurô e turista esbanjava

- VIN ICIUS TORRES FREIRE

“HOTÉIS PARA cachorro têm fila de espera”, dizia o título de uma página desta Folha do fim de 2011. Não havia lugar para deixar o cão no Réveillon. Na foto da reportagem, um pequeno pug tomava banho em um ofurô aromatizad­o com pétalas.

Havia pouco assunto no dezembro do primeiro ano de Dilma Rousseff. As manchetes de então mal renderiam notas no pé da primeira página dos jornais deste desgracent­o 2015.

O Brasil crescera 7,5% em 2010 e deveria crescer “apenas” 3,9% em 2011 (neste 2015, vai encolher mais de 3,5%). A empresa oficial de promoção de Nova York anunciava que o brasileiro era o turista que mais gastava na cidade, o dobro da média, tendo ultrapassa­do britânicos, australian­os e canadenses.

As controvérs­ias maiores, algo caídas, eram a Lei da Palmada e um conflito entre CNJ e Supremo. A gente estava preocupada mesmo era em gastar.

O governo estava feliz feito pinto no lixo. Saíra a notícia de que a economia estava para ser a sexta maior do mundo, ultrapassa­ndo a do Reino Unido. Em 2015, chutavam governo e FMI, o Brasil passaria a França. Em 10 ou 20 anos, o Brasil teria “padrão de vida europeu”.

O PIB brasileiro desceu para o 10º lugar, por aí (a conta é imprecisa). Nossa pobreza relativa é quase a mesma, pois nosso PIB per capita ainda anda pela casa do 75º lugar.

O PIB parecia grandão porque um dólar custava R$ 1,82 no final de 2011, maluquice irrealista que ajudava a quebrar a indústria. Era o dólar da Bolsa Miami, que não poderia durar, dados o deficit externo e a inflação crescentes. Quando viesse a depreciaçã­o, e viria, o PIB do Brasil em dólares cairia.

O PIBão era delírio de grandeza, o mais inofensivo, como descobrirí­amos a partir de 2012.

No fim de 2011, Dilma Rousseff estava incomodada com o que então se julgava PIBinho e já pedia “medidas de estímulo”. Contivera-se durante 2011, a contragost­o: fazendo superavit fiscal de 3%, para surpresa do “mercado”.

Para variar, a gente se queixava de que a despesa do governo ainda aumentava mais que o PIB; de que a contenção de gastos do governo era torta, por exemplo feita à base de um “grande” corte de investimen­tos (8%! Neste ano será de 40%).

Eram necessário­s “planos de longo prazo, que não temos” (bidu). No curto prazo, era preciso “juro menor, o que será possível se o governo não inflaciona­r a economia com medidas desesperad­as de estímulo ao crédito e de aumento de gasto”. Foi o que Dilma fez, a partir de 2012. Até então, era bem tratada.

Dizia-se que a popular presidente tinha feito fama na classe média também por causa da “faxina”, a demissão de meia dúzia de ministros com jeito de corruptos, embora a lambança fosse culpa de Dilma, que nomeara essa gente em acordo com Lula. Elogiava-se o estilo das roupas dela, a presidente que conduzia o país para o alto do pódio dos PIBs mundiais, dizia o colunismo de moda.

No início do ano, os economista­s do governo estimavam que o país cresceria a 6% ao ano sob Dilma, que lá pelo meio do ano “garantia” ao menos 4,5%. Muita gente graúda dizia que a presidente era “responsáve­l”, mas enganada por economista­s desenvolvi­mentistas malvados.

Que em 2020 a gente possa rir do nosso pessimismo de 2015.

Nas festas de 2011, Brasil seria potência, ‘europeu’, cão fazia ofurô e turista torrava a Bolsa Miami

vinicius.torres@grupofolha.com.br

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