Folha de S.Paulo

Em janeiro de 2015, Mauro Vieira assumiu como o terceiro

-

chanceler de Dilma Rousseff em meio a uma crise de Orçamento, um ministério sem prestígio internamen­te e um Brasil cada vez menos relevante no cenário internacio­nal.

Agora, chega ao fim de seu primeiro ano à frente do Itamaraty com um panorama menos drástico nas contas da pasta, mas também com poucos avanços na retomada de uma política externa de maior expressão, diante do acirrament­o da crise no país.

Internamen­te, um plano de racionaliz­ação de gastos permitirá à pasta, segundo o ministério, encerrar 2015 sem os atrasos nos pagamentos de aluguéis e de auxílio-moradia no exterior que foram constantes durante todo o ano.

Lá fora, Vieira conseguiu, segundo especialis­tas, começar a fazer a política externa do país se mover novamente.

Para isso, ampliou sua presença no exterior —foi o chanceler que mais viajou desde 2011, o primeiro ano de Antonio Patriota. Em um momento em que as prioridade­s do Planalto eram outras, Vieira fez cerca de 75% de suas 53 viagens sem a presidente.

A maior parte de sua ação no exterior foi com visitas bilaterais, o que demonstra um esforço em tentar promover ou retomar relações com outros países.

“No momento, é o que dá para fazer. Não podemos ter uma agenda enfática porque temos pouca bala na agulha”, observa Luiz Felipe Lampreia, que foi chanceler no governo FHC (1995-2001).

Para Matias Spektor, professor da FGV e colunista da Folha, um dos pontos positivos da gestão Vieira foi retomar a agenda de viagens.

“Embora não tenha resultado em nenhum grande acordo, ao menos voltou a trazer a diplomacia brasileira para os trilhos, dos quais tinha saído por causa das crises econômica e política”, afirma.

Em dois avanços importante­s, o Brasil superou impasses que travavam a agenda com EUA e Bolívia desde 2013.

A viagem da presidente a Washington, em junho, marcou a reaproxima­ção dos países após o escândalo da espionagem dos EUA a autoridade­s brasileira­s dois anos antes.

No caso boliviano, o envio de um novo embaixador a La Paz após dois anos da fuga do senador local Roger Molina da embaixada brasileira foi fundamenta­l para reatar o diálogo mais fluido com o vizinho.

Outros pontos tidos como positivos foram o início das negociaçõe­s para ampliar o acordo comercial com o México e o périplo de Vieira por oito países da África subsaarian­a —em pouco mais de um ano no posto, seu antecessor, Luiz Alberto Figueiredo, só foi ao continente para acompanhar a presidente no funeral de Nelson Mandela, em 2013. VENEZUELA A atuação discreta de Vieira —e do então colega argentino, Héctor Timerman—, contudo, não foi suficiente para fazer com que Venezuela e Colômbia escolhesse­m o Brasil (e a Argentina) para mediar o diálogo sobre o conflito na fronteira entre os dois. Caracas e Bogotá acabaram escolhendo Uruguai e Equador.

O Itamaraty foi ainda criticado por não se manifestar publicamen­te em relação às prisões de políticos na Venezuela e por não respaldar a posição do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) sobre a missão da Unasul para observar as eleições em 6 de dezembro.

O TSE decidiu não participar da missão após um veto não oficial de Caracas a Nelson Jobim. O Itamaraty acabou enviando um diplomata com a missão, o que diminuiu o mal-estar com Caracas.

Outros imbróglios envolveram a decisão do governo de não receber, por oito meses, as credenciai­s do embaixador indonésio, Toto Riyanto, após a execução de dois brasileiro­s, e o cancelamen­to, em cima da hora, da viagem da presidente ao Japão e ao Vietnã.

Para o professor José Augusto Guilhon Albuquerqu­e, da USP, diante da crise, o próximo ano exigirá de Vieira trabalho semelhante ao que realizou neste ano. “Neste caso, o chanceler tem um papel de encarregad­o de negócios. O que ele pode fazer é tocar assuntos correntes”, diz.

“Não tem como ter agenda ambiciosa se não tem motor para decolar esse avião”, concorda Lampreia.

Para os especialis­tas, o foco de Vieira deve se manter sobre a transição nos EUA, a nova conformaçã­o da região e do Mercosul com a ascensão de Mauricio Macri na Argentina e em não perder mais espaço no mundo. (ISABEL FLECK)

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil