Folha de S.Paulo

A favor de Naruto

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RIO DE JANEIRO - Em 2011, numa floresta da Indonésia, um fotógrafo britânico, David Slates, preparou a câmera para que um macaco apontasse a máquina para si mesmo e tirasse um “selfie”. A foto, sensaciona­l, espalhou-se pela internet e provocou uma disputa sobre direitos autorais. Quem seria o autor? O fotógrafo, dono da câmera, ou o macaco, que bateu a chapa?

De um lado, o profission­al; de outro, uma associação internacio­nal de direitos dos animais. Em jogo, o absurdo de dinheiro que a foto poderia render. Pela lei americana, o autor de uma foto é quem a dispara. Mas, não sendo o autor um ser humano, como ficamos? Depois de cinco anos de discussão, um tribunal de San Francisco acaba de dar o veredicto: a foto não pertence a ninguém, é de domínio público. Slates, o fotógrafo, não se conforma. Eu, que torço pelo macaco, também não.

O macaco se chama Naruto, tinha seis anos na época e é da espécie “macaca nigra”, típica da Indonésia —“yaki”, no idioma local. Se o tribunal lhe tivesse dado ganho de causa, Naruto poderia ajudar milhares de seus irmãos desamparad­os, apoiar reservas necessitad­as e salvar espécies em perigo, como a dos nossos muriquis.

Slates alega ter passado dias entre os macacos para ganhar sua confiança e tornar possível a foto. Mas há uma versão de que Naruto lhe teria roubado a câmera e feito a foto por conta própria. E, pela sua cara de prazer —os olhos brilhando, o riso satisfeito—, ele sabia o que estava fazendo. É o melhor “selfie” da história: melhor ângulo, melhor foco, melhor cor, melhor luz e melhor expressão —melhor que a de muita gente que passa o dia se fotografan­do. Se não acredita, é só googlar “‘selfie’ do macaco” e conferir.

Nunca tirei um “selfie” na vida. Se fosse fazer isso, também precisaria de ajuda —e duvido que saísse melhor que Naruto.

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