CRÍTICA Depoimento sobre câncer pode ajudar, porém não é literatura
Leonor Xavier relata experiência com a doença em ‘Passageiro Clandestino’
FOLHA
Não é muito comum nem previsível, mas às vezes também pode caber ao crítico prestar um depoimento. E, neste caso, o fato é que é uma espécie de impasse fazer a crítica literária de um livro que se apresenta como literatura, mas que é, na realidade, um depoimento sincero e sofrido de vida.
O impasse é: o livro é escrito de forma clara, tendencialmente poética, com belas lições de sobrevivência e de convivência com a doença-tabu da atualidade —o câncer. Certamente vai servir para ajudar muitas pessoas que sofrem do mesmo mal ou seus parentes e amigos, além de todos os que tememos a aparição desavisada dessa vida que cresce desordenada dentro de outra vida, matando-a.
Então como e até por que criticar negativamente um livro como esse?
Porque depoimento sincero não é literatura. Como talvez dissesse Manuel Bandeira, em algum poema chamado “Novíssima Poética”, serão cartas, diários, desabafos, livros de autoajuda, ajudas necessárias, francas e bem colocadas para quem precisa, e, afinal, todos precisamos. LEITURA AUXILIAR A verdade é que livros assim são dificilmente criticáveis e deveriam ser apresentados como leitura auxiliar, o que em nada os desmereceria. perança, que é um dom, uma graça”; “em face da doença (...) a doçura (...) é um mel que adoça a vida”; “a amizade é uma doçura nesta vida”; “agradeço pela amizade que me tem sido dada” e várias construções afins.
O crítico escreve as frases acima, e já o ronda a culpa. Mas como falar mal dessas frases, quando elas são ululantemente verdadeiras e, mais, podem efetivamente ajudar pessoas?
Sim, há a economia dos capítulos, trechos originais, citações interessantes, uma linguagem que não transborda excessivamente. Mas tudo isso são considerações laterais sobre um livro que, definitivamente, não é literário, pois acrescentar elementos estilísticos ou subjetivos a um texto não o torna imediatamente ficcional e/ou estético.
Pode ser que o leitor chegue à conclusão que esta crítica, em si mesma, é inútil, porque útil, de verdade, é ajudar os doentes.
Mas agora precisaríamos conversar sobre os conceitos de utilidade e inutilidade na própria literatura e na crítica como um todo. Fica para uma próxima.
NOEMI JAFFE Olympio, agora atuar como agente do poeta —ao mesmo tempo em que é editora da mineira Autêntica. “Isso é tão pouco usual que eu nunca tinha visto”, diz Elisa Rosa, da JO. Maria Amélia também cuida da obra de Raul Bopp, José Lins do Rêgo e Campos de Carvalho — este último, aliás, deixou a Record em setembro de 2015 e vai para a própria Autêntica. A editora da casa mineira afirma que continua a fazer o mesmo de quando esteve à frente da José Olympio, onde também cuidava dos direitos de autores para o exterior, por exemplo. “Não vejo conflito de interesses, porque a Autêntica nem foi cogitada [para Gullar]”, afirma. “O Campos de Carvalho é um caso especial, os herdeiros queriam ir para onde eu fosse, e avisei à JO disso quando saí. Sobre o Gullar, foi dada toda prioridade à Record. Se eles tivessem tentado com mais garra, teriam ficado com o autor”, afirma.