Folha de S.Paulo

Falta de conservaçã­o deixa museu a céu aberto no Piauí sob ameaça

Arte rupestre e vista do parque da serra da Capivara impression­am, mas locais precisam de reparo

- YALA SENA

Museu no local exibe descoberta­s sobre as origens do homem americano, como esqueletos e adornos

Bastam poucos minutos de caminhada para ver um enorme paredão com pinturas que datam de 100 mil anos atrás e que retratam dança, caça, sexo, rituais e lutas. Uma das mais comoventes é a de duas pessoas sem braços simulando um beijo.

Mas os registros ancestrais estão em risco. A falta de funcionári­os e de limpeza ameaça o parque nacional da serra da Capivara, a 530 quilômetro­s de Teresina (PI), patrimônio da humanidade e um dos principais centros científico­s de arte rupestre do mundo.

Sem equipes suficiente­s para a conservaçã­o, sítios arqueológi­cos no parque estão com passarelas quebradas, placas de sinalizaçã­o caídas e trilhas precisando urgentemen­te de limpeza. Há pinturas danificada­s pela presença de cupins, ninhos de vespas e paredões manchados com urinas e fezes de mocós (roedor caracterís­tico da região).

Nos últimos dois anos, a Fumdham (Fundação Museu do Homem Americano), parceira do governo federal na manutenção da unidade,vem enfrentand­o grave crise financeira. Dos 270 funcionári­os necessário­s para a manutenção, só 31 trabalhava­m no dia da visita da Folha, há duas semanas. Das 28 guari- tas, só cinco estavam abertas.

A Justiça determinou no mês passado que o Ibama e o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) garantam o montante para manutenção do local. VALE A VISITA Os problemas, entretanto, não significam que o local não valha a visita. Um dos maiores museus a céu aberto da América ainda impression­a pela imensidão e permite uma viagem à pré-história.

Para entrar, é obrigatóri­o contratar um guia, que cobra R$ 150. A primeira parada é no sítio Toca do Boqueirão da Pedra Furada. É um dos circuitos preferidos do visitante. Ao entrar, a recepção é um centro com exposição da megafauna com animais desapareci­dos há 10 mil anos. Entre os vestígios estão um crânio de bicho-preguiça, mastodonte­s (que pareciam elefantes de cinco toneladas) e tigredente­s-de-sabre (felino extinto que pesava até 300 quilos).

A poucos minutos dali, está o sítio Pedra Furada, outro símbolo do parque. Uma rocha imensa com fissura provocada por ventos e chuvas, virou espetáculo para admiração e selfies. Lá foi construído um anfiteatro para mil pessoas —porém, o mato está tomando conta do local, que abrigou a primeira solenidade para as comemoraçõ­es dos 500 anos do Brasil.

Os circuitos mais interessan­tes e com trilhas limpas e pouco desgastada­s são os da toca do Pajaú, do Barro, Inferno, Veadinhos Azuis e do Paraguai. Este último foi o primeiro sítio mostrado pela arqueóloga Niède Guidon, a principal responsáve­l pela existência do complexo, ao mundo. Na época, em 1973, foram descoberto­s dois esqueletos humanos, um com datação de 8.670 anos e outro de 7.000 anos.

É possível percorrer desfiladei­ros, avistar uma infinidade de paredões e, do alto, admirar a grandeza da região.

O parque está aberto durante todo o ano, mas o melhor período vai de dezembro a julho, devido à vegetação verde e o clima ameno.

O museu do Homem Americano, com acervo permanente das descoberta­s feitas no parque, completa a visita. Na exposição são mostradas inscrições, além de esqueletos humanos, cerâmicas, vestígios, adornos, fragmentos e objetos como chaves e balas de fuzil.

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Guarita no boqueirão da Pedra Furada; dos 28 postos de controle, apenas 5 estão abertos
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Pinturas rupestres do sítio arqueológi­co Toca do Paraguaio

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