Folha de S.Paulo

As tarefas do presidente Temer

- REINALDO AZEVEDO COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Celso Rocha de Barros, terça: Mario Sergio Conti, quarta: Elio Gaspari, quinta: Janio de Freitas, sexta: Reinaldo Azevedo, sábado: Demétrio Magnoli, domingo: Elio Gaspari e Janio de Freitas

O PRESIDENTE Michel Temer tem uma difícil tarefa pela frente. Não é a primeira vez que um vice assume em razão do impediment­o do titular. Em 1992, a queda de Collor e a ascensão ao poder de Itamar Franco fizeram um bem imenso ao Brasil. Sem esse evento fundador, não teria existido o Plano Real. E nada além da irrelevânc­ia nos espreitari­a hoje.

Notem: Michel Temer deu início a seu mandato com uma força política individual muito maior do que dispunha Itamar, que nem partido tinha quando ascendeu à Presidênci­a. O PRN, ao qual havia aderido, se esfacelara durante o chamado “collorgate”. Essa força de Temer, no entanto, também é uma vulnerabil­idade. O PMDB é uma máquina de muitas demandas e, vá lá, com uma ideologia que tem bem mais do que 50 tons de cinza.

E, como está claro pra todo mundo, o presidente precisa responder a outras expectativ­as, oriundas dos partidos de oposição —moral e politicame­nte obrigados a dar sustentaçã­o ao governo— e a legendas que se mantêm na situação: estavam com a ex-presidente Dilma, estão com o presidente Temer. A realidade política brasileira não muda do dia para a noite.

É certo que um primeiro passo foi dado e já começa a surtir efeito. O casamento da crise política com a crise econômica havia gerado um terceiro estado da matéria da instabilid­ade, que é a crise de confiança. Ninguém sabia o que queria ou pensava a presidente deposta. Não estamos vivendo dias de euforia com a posse de Temer, e nem é o caso, mas cresceu bastante o otimismo dos agen- tes econômicos.

Uma nota à margem: não será, porque nunca foi, tarefa trivial lidar com os aparelhos do PT que, como se percebe, passaram a falar a linguagem dos milicianos. Alguns dos esbirros do partido, como MST e MTST, passaram a pregar a “ruptura” com o regime —até onde entendo, com o regime democrátic­o. Para eles, acabou a fase do “protesto a favor”. Bem, meu caros, dizer o quê? Problemas sociais são da conta do governo; banditismo deve ser enfrentado pelas forças de segurança.

Nós, os decentes, não achamos que, “em política, tudo pode”, à diferença do ex-ministro Aloizio Mercadante —que, junto com Lula e Dilma, pode vir a ser preso por obstrução da Justiça. Tal norte moral não serve nem aos propósitos do PCC. Marcola certamente diria ao petista que é preciso ter um pouco de ética na sacanagem.

O presidente Temer tem uma bússola. Ela atende pelo nome de “Ponte para o Futuro” (pmdb.org.br/wpcontent/uploads/2015/10/RELEASETEM­ER_A4-28.10.15-Online.pdf), um documento com diretrizes gerais para um programa de governo que, se

Tão importante quanto se articular no Congresso é manter o diálogo com os movimentos organizado­s

aplicado, tornará o Brasil um país contemporâ­neo do século 21.

O texto tem uma clara inflexão liberal e aposta mais na sociedade do que no Estado. Nos pouco menos de três anos que lhe restam de mandato, Temer não conseguirá realizar o futuro, mas pode usar essa nova maioria que o apoia no Congresso para fazer a ponte.

Finalmente, tão importante quanto se articular no Congresso é manter o diálogo com os movimentos organizado­s da sociedade civil, como MBL e Vem Pra Rua, que são os principais artífices do impeachmen­t de Dilma.

A política institucio­nal, como se sabe, aderiu à causa mais tarde. E não pensem que acho isso ruim. Ao contrário! Essa é uma das boas novidades desses tempos. E o presidente tem de saber que esses novos atores aceitam interlocuç­ão, mas nunca a subordinaç­ão. Facebook: on.fb.me/1SVhuvw

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