É preciso respeitar as instituições brasileiras
PARA O PRESIDENTE DA BRF, SE CRISE NÃO FOR ENFRENTADA COM EQUILÍBRIO, PAÍS PODE PERDER DIFERENCIAL ENTRE EMERGENTES
DE SÃO PAULO
Principal diferencial do Brasil entre os países emergentes, a força das instituições deve ser preservada durante a crise política. A opinião é de Pedro Faria, presidente global da BRF, gigante de alimentos dona das marcas Sadia e Perdigão.
O executivo prefere não comentar os últimos acontecimentos políticos e não revela sua posição sobre o impeachment da presidente Dilma Rousseff, mas manifesta uma preocupação em relação a esse processo: “Tudo deveria ser feito num respeito às instituições muito grande. Não podemos ter um desequilíbrio de poder, em que o Judiciário de repente virou o vetor do que se faz ou se deixa de fazer. Por outro lado, também não podemos ter um Legislativo de conveniência”, disse Faria à Folha.
Ao lado de Abilio Diniz, presidente do conselho de administração, Faria é responsável pela transformação da BRF desde 2013, incluindo o processo de internacionalização. O maior desafio, diz ele, foi criar uma identidade para a empresa que nasceu da fusão de duas rivais.
Faria revelou que a companhia deve investir cerca de R$ 2 bilhões neste ano, com foco em inovação e na expansão internacional, o que deve incluir aquisições. Folha - Como a BRF está sendo afetada pela crise?
Pedro Faria - O primeiro ponto que eu acho importante colocar é que a BRF é uma empresa consciente, que vai buscar ser protagonista numa agenda positiva de investimentos. Mas tem o lado do instinto de sobrevivência, que fica bem aguçado. Apertamos o cinto ainda mais. Foi preciso demitir?
Temos um processo de ganho de produtividade que começou em 2013 ou 2013. Não fizemos demissão em massa e não fechamos fábrica. Os nossos movimentos foram muito claros de ganho de eficiência. Esse instinto de sobrevivência tem a ver com o caixa. Não estamos num momento em que podemos fazer um monte de coisas, embora a empresa seja hoje um dos créditos mais sólidos do Brasil. Manteve o grau de inves- timento quando o rating soberano caiu várias notas. Mas o meu CEP é do Brasil, então estou sujeito a tudo isso. Qual é a sua opinião sobre o momento político atual?
A minha maior preocupação como cidadão e líder empresarial é que não podemos arriscar com as instituições que temos. Estamos num limiar muito tênue de começar a rasgar esse respeito às instituições, e isso, para mim, não volta. Você é a favor de uma mudança no governo?
Cada um tem a sua opinião e eu tenho a minha. Independentemente disso, acho que tudo deveria ser feito num respeito às instituições muito grande. Não podemos ter um desequilíbrio de poder, em que o Judiciário de repente virou o vetor do que se faz ou se deixa de fazer. Por outro lado, também não podemos ter um Legislativo de conveniência. No auge da nossa novela, do nosso “House of Cards” interno, a gente perde essa noção de que isso é um passo de perdermos a credibilidade.
O Brasil sempre teve um bastião muito forte. Não é o país que mais vai crescer, não é o país que tem o maior bônus demográfico, não é o país que embarcou numa transformação industrial... Agora, como instituições, estamos muito à frente dos Brics [grupoformadoporÍndia, Rússia, China e África do Sul, além do Brasil] e comparáveis. Eu me sinto responsável como líder empresarial de preservar isso. De que, no afã do exagero da mudança ou da continuidade, não se rasgue isso. Se você não rasgar isso, temos um futuro muito bacana. Em janeiro, você completou um ano à frente da BRF. Ao lado de Abilio Diniz, implementa uma reestruturação na companhia desde 2013. Essa reestruturação acabou?
Essa jornada se renova todo dia. Eu não tenho uma resposta porque, a cada etapa vencida, outra se abre. A verdadeira transformação que a companhia fez foi a organizacional/cultural, na maneira como ela engaja seus funcionários. Sinto que pegamos uma história muito multifacetada, cheia de camadas. De repente, com um pouco de fogo, derretemos aquelas camadas e tornamos issoumacoisabemuniforme. Acabou aquela rivalidade que existia entre as equipes de Sadia e de Perdigão?
Acho que hoje não tem mais essa coisa de Sadia e de Perdigão. Não tem a coisa do velho e do novo, do internacional e do Brasil, do mercado e da fábrica. O meu principal desafio é fazer a empresa, que tem uma cadeia muito longa, sentir que ela é menor, compacta, mais íntegra. Não dá para dizer que está tudo feito. É um trabalho que tem de estar focado o dia inteiro.
A internacionalização se tor-
“
No ramo de alimentos, a Sadia hoje é a maior marca do mundo. Não consigo descobrir no portfólio da Nestlé, Unilever, Kraft, Tyson uma única marca que tenha faturamento global perto de US$ 5 bi como a Sadia. Se a gente conseguir ser uma marca global reconhecida, será um legado fantástico