Folha de S.Paulo

Agora você entende porque sempre estou sorrindo?”

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mento das oito vítimas de Francisco Morato.

Ele trabalha há 28 anos com enterros e já se acostumou a levar vítimas da chuva na cidade onde nasceu. O município é cheio de morros e tem parte da sua população vivendo em áreas de risco.

Avelino ergue o dedo e aponta: “Naquele barranco já morreram dois, há três anos. Tá vendo aquele terreno? Tem uns dez anos que morreram outros três, num deslizamen­to”. Dessa vez, ele enterrou vários conhecidos. O garoto Jorge, por exemplo, cresceu brincando com seu filho.

Na frente da casa emprestada por amigos para a família viver, Onório conta que encontrou uma carteira da filha Sandra nos escombros. Dentro, havia uma foto dele com uma frase escrita: “Você é o melhor pai do mundo. Sempre tente dar um sorriso, pai”.

Com as sandálias da filha morta nas mãos, ele afirma: “Meu amigo, quando li isso, minha cabeça diminuiu. Meu coração aumentou assim, ó. DE CABEÇA BAIXA No mesmo bairro, o agente funerário Cristiano estaciona em frente ao mercado onde trabalhava o açougueiro Alexandre Donizete Ferreira, 43. Ele e a mulher, Flavia Costa, 34, também morreram em um deslizamen­to.

Alê, como era conhecido, trabalhou por mais de dez anos ali. “Entrou quando ainda era uma quitanda”, conta um colega. Quando a lojinha cresceu, foi cortar as carnes. “Ele gostava de fazer churrasco, era tranquilão”, afirma.

Quatro dias depois do desabament­o, o filho do casal, de 16 anos, assumiu o lugar do pai no mercado —com pena, os donos contratara­m o adolescent­e. Muito triste, ele não quis dar entrevista. “Anda sempre com a cabeça baixa”, relata outro funcionári­o.

O HOMEM MAIS TRISTE

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