Folha de S.Paulo

Com o corregedor:

- FERNANDA MENA

DE SÃO PAULO

Em três meses no cargo, o novo corregedor do Tribunal de Justiça de São Paulo, Manoel de Queiroz Pereira Calças, propôs um pacote de medidas de acesso à Justiça que deve acelerar a concessão de indultos aos presos, a revisão dos processos e a ampliação das audiências de custódia para o interior do Estado.

As iniciativa­s, que visam conceder aos presos benefícios previstos em lei, devem impactar os superlativ­os números do sistema penitenciá­rio de São Paulo: 240 mil presos (mais de um terço dos 650 mil do país), sendo 100 mil deles provisório­s, ou seja, sem condenação definitiva, encarcerad­os ao custo médio de R$ 8.000 por mês cada um.

“Ninguém está falando em esvaziar as cadeias. A questão é analisar os benefícios que a lei penal concede aos detentos e aplicá-las com eficiência e rapidez”, explica. “Quando se deixa um apenadoumd­ia,ummêsouuma­no a mais do que sua sentença, faz com que ele desacredit­e do sistema como um todo.”

Leia trechos da entrevista Folha - O que é indulto e por que é importante agilizá-lo?

Manoel de Queiroz Pereira Calças - É um benefício outorgado pela Constituiç­ão em que o presidente concede liberdade a presos dentro de certos parâmetros, excluindo-se casos de crimes hediondos. O indulto exclui a pena, mas não a punibilida­de.

Seria um benefício automático, não fosse necessário verificar o enquadrame­nto de cada detento aos requisitos que o decreto estabelece.

O indulto assinado pela presidente dezembro passado deve beneficiar cerca de 7.000 presos só no Estado de São Paulo. Todos os enquadrado­s ficam com intensa expectativ­a: sair do presídio superlotad­o, reencontra­r a família, recomeçar a vida.

Quando esse direito não é atendido com a maior brevidade possível ou razoável, gera frustração que pode levar a motins e violência. O que atrasa essa concessão?

Há uma discussão que envolve a necessidad­e ou não de o juiz pedir um parecer para cada caso ao Conselho Penitenciá­rio, um órgão estadual composto por até 30 juízes, advogados, promotores e professore­s.

Se são ao todo 7.000 beneficiad­os, ou seja, 7.000 pareceres expedidos por até 30 membros do Conselho, o processo se torna lento. E o indulto chega a demorar um ano para ser concedido.

Um preso paulista tem custo mensal de cerca de R$ 8.000, contando a estrutura do presídio, a alimentaçã­o, as saídas para audiência etc. O Executivo não tem interesse de empregar dinheiro de tributo em presos que, pela legislação e pelo decreto, já teriam o direito de sair. Como reverter esse quadro?

A Corregedor­ia expediu um comunicado aos juízes declarando que não há necessidad­e por parte deles de requerer o parecer do Conselho Penitenciá­rio para conceder o indulto. A Lei de Execuções Penais prevê o parecer do Conselho nos casos de indulto individual. Mas essa lei é anterior à Constituiç­ão, que consagrou o indulto coletivo por decreto presidenci­al.

Trata-se de uma recomendaç­ão. Minha preocupaçã­o foi com a aplicação do indulto com eficiência e rapidez. Outras medidas podem aprimorar o acesso dos presos à Justiça?

Começamos a fazer um exame da situação da população carcerária do Estado com o escopo de verificar quem tem direito a qualquer tipo de benefício, e fazer cumprir a lei. Ninguém está criando nada. O princípio é da legalidade.

A ideia é fazer mutirões a partir do regime semiaberto para liberar espaço para quem vier, depois, do regime fechado ainda neste ano.

Se o condenado tem direito a algum tipo de benefício, isso tem de ser concedido, independen­temente da ideologia e interpreta­ção do direito. De que maneira a ampliação das audiências de custódia pode desafogar o sistema?

Elas foram criadas pelo CNJ [Conselho Nacional de Justiça] e deram muito certo.

Mas há uma logística para implementa­r essas audiências no interior do Estado. É preciso determinar como elas serão feitas nas regiões administra­tivas e circunscri­ções e como organizá-las nos finais de semana, por plantões.

O custo existe, mas a contrapart­ida é maior. A custódia é um investimen­to. Aproximada­mente 50% dos detidos levados a audiências de custódia são liberados. E o índice de reincidênc­ia daqueles liberados não chega a 5%.

Tirar essas pessoas do contato com o sistema penitenciá­rio, evita que sejam contaminad­as ou arregiment­adas.

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