Folha de S.Paulo

Visto sem fim

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Como efeito da crise econômica, tornou-se ainda mais distante o dia em que os brasileiro­s não precisarão de visto para viajar aos Estados Unidos. A constataçã­o é de Sérgio Amaral, indicado para ser o novo embaixador do Brasil nos Estados Unidos, em entrevista a esta Folha publicada na última quarta (20).

De acordo com o diplomata, a atual recessão levou a um cresciment­o do número de postulante­s que tiveram a entrada nos EUA negada. O motivo é a suspeita de que intentasse­m se estabelece­r e trabalhar ilegalment­e naquele país.

Com isso, o Brasil superou recentemen­te o percentual de rejeição de pedidos de visto abaixo de 3%, condição necessária, ainda que não suficiente, para entrar no pequeno grupo de países isentos —40 ao todo, dos quais apenas um, o Chile, está na América Latina.

Se a conjuntura brasileira não ajuda, o clima político norte-americano em torno da imigração tampouco é favorável —basta notar a grande ressonânci­a no eleitorado do discurso xenófobo promovido pelo agora candidato republican­o à Casa Branca, Donald Trump.

A isenção de vistos entrou com força na agenda bilateral em 2012, por pressão de Brasília. Na época, a economia aquecida e o dólar barato fomentaram uma escalada do turismo brasileiro ao exterior. Naquele ano, houve 1 milhão de pedidos de vistos, um recorde até então.

Do outro lado, contudo, não houve esforço para que as negociaçõe­s chegassem a bom termo. Os norteameri­canos evitaram dar prazos e preferiram centrar os esforços na melhoria do serviço consular —o que de fato aconteceu, embora o processo continue custoso e desagradáv­el, principalm­ente para quem mora em cidades distantes.

Os entendimen­tos foram atrasados por uma série de exigências burocrátic­as, como o acesso a informaçõe­s tributária­s dos viajantes e a liberação de nomes de pessoas investigad­as pela polícia.

A exigência de visto constitui uma excrescênc­ia. Mesmo com a recessão atual, a esmagadora maioria dos brasileiro­s tem sua entrada nos EUA autorizada. No ano passado, 2,2 milhões deles visitaram aquele país e lá gastaram US$ 13,6 bilhões, segundo o Departamen­to de Comércio.

Pelo princípio da reciprocid­ade, não resta alternativ­a ao Itamaraty além de também exigir o visto de cidadãos norte-americanos. Em que pese o impacto negativo na indústria de turismo, trata-se de uma política condizente com o peso diplomátic­o do Brasil no mundo.

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