Folha de S.Paulo

Mostra expõe rugas da tecnologia e paradoxos da lógica urbana

Giselle Beiguelman revê experiênci­as digitais em ‘Cinema Lascado’

- GUSTAVO FIORATTI

FOLHA

Em uma sala da Caixa Cultural, no centro de São Paulo, Giselle Beiguelman conta que algumas imagens exibidas em “Cinema Lascado”, ali em cartaz até o fim de setembro, foram captadas com celulares “muito antigos”.

Dez anos foram suficiente­s para cravar um adjetivo que outrora cairia melhor a um telégrafo. Beiguelman começou a trabalhar com câmeras de celular em 2005, e a linguagem que desenvolve­u a partir de então cumpre a constataçã­o inevitável: a tecnologia chega ao mercado já com suas rugas expostas.

Pioneira na produção de obras relacionad­as ao sistema binário da era digital, Beiguelman conta que seus primeiros celulares captavam 16 quadros por segundo e operavam por no máximo 30 segundos.

A relação da artista não é apenas com a tecnologia. As ferramenta­s digitais, como é possível ver na mostras, são usadas para registrar paradoxos da lógica urbanístic­a. Dois elevados —o Minhocão, em São Paulo, e a extinta Perimetral, no Rio— dão volume à ideia que ela define como “estética da obsolescên­cia”.

Em uma das instalaçõe­s, ouve-se o estampido da demolição da Perimetral, mas som e imagens não sincrônico­s. Algo se interpõe entre a formação dessa “cicatriz urbana” e seu registro no celular.

Trata-se de um ruído, ou acidente, provocado pela defasagem dos programas usados para filmar e editar. “A gente esquece que a câmera de celular é um sensor. Ela decodifica a luz e a transforma em um código de cor.”

O que vemos, então, é um trabalho capaz de revelar a codificaçã­o. Ainda na mostra, que tem curadoria de Eder Chiodetto, impressões em grande formato exibem outras feridas urbanas.

Há um dado a mais que Beiguelman transporta agora para outra exposição, “Quanto Pesa uma Nuvem?”, no Galpão VB: tornou-se sua marca filmar a paisagem que passa pela janela do carro. Na exposição, Beiguelman exibe um trajeto até o campo de concentraç­ão de Auschwitz.

Em uma instalação vizinha, ela narra reflexões não só sobre a viagem e o horror do holocausto, mas também sobre a condição de visitar o país de onde sua família emigrou. Acostumada à ausência de gente em seus retratos, ela define este como seu trabalho de maior exposição pessoal. QUANDO de ter. a dom., das 9h às 19h; até 25/9 ONDE Caixa Cultural, pça. da Sé, 111, tel. (11) 3321-4400 QUANTO grátis QUANDO de ter. a sex., das 12h às 18h, e sáb., das 11h as 17h; até 20/8 ONDE Galpão VB, av. Imp. Leopoldina, 1.150, tel. 11 3645-0516 QUANTO grátis

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