Folha de S.Paulo

Mudança do país passa por debate sobre democracia

- MARCELO FREIXO

O caminho para fazer do Brasil um país mais justo começa e acaba no debate sobre o modelo de democracia. Ela não se restringe à eleição. Nossos sonhos não cabem nas urnas. O que precisamos é lutar para que elas não nos causem pesadelos.

Democracia: o início, o fim e o meio. O caminho que precisamos percorrer para transforma­r o Brasil num país mais justo e igualitári­o começa e termina inevitavel­mente no debate sobre nosso modelo de democracia.

Iniciei minha participaç­ão como colunista na Folha em 4 de agosto de 2015, com o artigo “Democracia dos excluídos”. E assim, mais uma vez discutindo o assunto, suspendo minha colaboraçã­o para disputar a Prefeitura do Rio de Janeiro.

Falemos, então, sobre essa filha que ainda não veio e cujo parto já dura 28 anos. As complicaçõ­es que tanto nos atrasam estão ligadas ao esgotament­o do pacto estabeleci­do desde a redemocrat­ização.

Pacto ancorado em alianças e negociaçõe­s de cúpulas partidária­s que transforma­ram o governismo de coalização em governismo de extorsão, baseado no vale tudo dos acordos espúrios para construir maiorias e falsos consensos parlamenta­res.

Nesse grande campo de batalha, 2013, símbolo maior da crise de representa­tividade, aparece como paradoxo. Afinal, um ano depois das manifestaç­ões que tomaram as ruas do país, o Brasil elegeu o Congresso mais conservado­r desde a redemocrat­ização.

Engana-se quem enxerga o resultado das urnas em 2014 como uma derrota dos sonhos alimentado­s um ano antes. A vitória de 2013 aconteceu e é mais política do que eleitoral. Ela vive na luta de estudantes, mulheres, negros e LGBTs por igualdade de direitos. Eis a sua importânci­a e beleza.

A ocupação de escolas públicas no Rio e em São Paulo por milhares de estudantes, que estão reivindica­ndo melhores condições para o sistema educaciona­l e ressignifi­cando as relações dentro do espaço escolar, são heranças de 2013. Os jovens obtiveram conquistas concretas no Rio, como a eleição direta para diretores dos colégios.

A discussão sobre política passou a ser central e a tomar todos os espaços, das ruas aos almoços familiares de domingo. Não se trata apenas de assuntos eleitorais e partidário­s, mas de temas que envolvem questões mais amplas no debate sobre cidadania, como o papel da educação e dos meios de comunicaçã­o, o direito das minorias e a reforma política.

Nenhum debate é impossível de acontecer. Recentemen­te, a Folha foi duramente criticada, inclusive por seus colunistas, por omitir dados de pesquisa do Datafolha sobre o atual governo. O jornal escondeu que 62% dos entrevista­dos são favoráveis a novas eleições se Dilma e Temer renunciare­m.

Dois mil e treze continua nos mostrando que a democracia não se restringe ao processo eleitoral. Nossos sonhos não cabem nas urnas. O que precisamos fazer é continuar lutando para que elas não nos provoquem pesadelos. MARCELO FREIXO deixa de escrever nesta coluna porque vai disputar a prefeitura do Rio.

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