BC manifesta dúvida sobre ajuste fiscal
Banco Central diz que não há ‘consenso’ sobre a velocidade na aprovação das medidas propostas pelo governo
Documento afirma que queda do juro depende de medidas e aponta risco de aumento de imposto para inflação
Há dúvidas no Banco Central sobre a capacidade do governo do presidente interino, Michel Temer, de obter aprovação para as medidas de ajuste fiscal propostas ao Congresso na velocidade necessária para assegurar uma redução dos juros neste ano.
A informação está na ata da mais recente reunião do Copom (Comitê de Política Monetária), divulgada nesta terça-feira (26). Na semana passada, o comitê do Banco Central manteve a taxa básica de juros em 14,25% ao ano.
“Todos os membros do comitê enfatizaram que a continuidade dos esforços para aprovação e implementação dos ajustes na economia, notadamente no que diz respeito a reformas fiscais, é fundamental para facilitar e reduzir o custo do processo de desinflação”, afirmou o Copom.
“Não houve consenso sobre a velocidade desses ajustes, o que sugere que constituem, ao mesmo tempo, um risco e uma oportunidade.”
O documento é o primeiro produzido depois que o economista Ilan Goldfajn assumiu a presidência do BC no lugar de Alexandre Tombini, que dirigiu a instituição durante o governo da presidente afastada, Dilma Rousseff.
O documento ganhou novo formato, ficou mais sucinto e adotou linguagem mais clara. Dos 20 parágrafos, 2 são dedicados à questão fiscal, que costumava ser tratada com cautela na era Tombini. Na gestão anterior, as atas evitavam mencionar a piora das contas do governo e manifestavam confiança no cumprimento das metas oficiais.
No documento divulgado nesta terça, o BC disse que vê sinais de que a recessão pode estar próxima do fim, mas afirmou que a inflação tem recuado a uma velocidade “aquém da almejada”.
O BC também se mostra preocupado com medidas de ajuste que podem ter impacto direto sobre a inflação, no que parece ser uma menção à possibilidade de aumento da tributação (e do preço) da gasolina, uma das opções em estudo no governo para fechar as contas deste ano.
A divulgação da ata afetou o mercado de juros futuros, em que investidores negociam contratos para se prevenir contra variações nas taxas de juros. Contratos com vencimento em janeiro de 2017 foram fechados com taxa de juros equivalente a 13,97%, acima dos 13,94% da véspera.
DEMORA A maioria continua apostando que o Banco Central começará a reduzir os juros na reunião do Copom marcada para outubro, mas o comportamento dos juros futuros sugere que alguns investidores começaram a desconfiar que a queda das taxas de juros poderá demorar mais tempo.
“Caso as medidas fiscais demorem, a percepção dos agentes dos mercados é que quedas de juros ficarão para o próximo ano”, escreveu o economista Alvaro Bandeira, da corretora Modalmais.
Para Luiz Eduardo Portella, sócio-gestor do Modal Asset Management, a ata do Copom indicou que o mais importante para o Banco Central é que os projetos apresentados pelo governo ao Congresso avancem. Mesmo que não sejam aprovados neste ano, isso ajudaria a reduzir as expectativas de inflação para 2017, segundo Portella.
O ex-diretor do Banco Central Carlos Thadeu de Freitas, chefe da divisão econômica da Confederação Nacional do Comércio, afirmou que o discurso mais duro revelado pela ata desta terça sugere a possibilidade de que os juros só caiam no próximo ano.
“O Copom está se mostrando menos otimista em relação ao cenário fiscal. O timing do ajuste fiscal está dado e é lento por natureza”, disse o economista. “Não vai ter queda de juros tão cedo. Talvez só no final do ano ou no começo do ano que vem.” (EDUARDO CUCOLO E EULINA OLIVEIRA)