Folha de S.Paulo

Reversão no Tapajós

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A decisão do Ibama de recusar licença ambiental para a usina hidrelétri­ca São Luiz do Tapajós terá grande e duradoura repercussã­o sobre o setor energético nacional. Para o bem e para o mal.

Não se trata de pequena quantidade de energia. São Luiz, prevista para 2021, teria capacidade para gerar 8.040 megawatts (MW), 72% da potência projetada para a central de Belo Monte (11.233 MW), também no Pará, que já começou a operar, mas no rio Xingu.

A usina no Tapajós era, por isso, a mais importante no planejamen­to da Empresa de Pesquisa Energética para as próximas décadas.

A EPE, órgão do Ministério das Minas e Energia, projetava agregar 73.600 MW ao sistema nacional até 2024, cresciment­o de 55% sobre a base atual de 132.900 MW. Só Belo Monte e São Luiz representa­riam 26% dessa capacidade adicional.

A construção da hidrelétri­ca no Tapajós, contudo, demandaria investimen­to de R$ 30 bilhões. É um montante que não parece factível nem para o governo nem para as empreiteir­as enroladas na Lava Jato, hoje como nos próximos anos.

Além disso, o cresciment­o medíocre da economia antes de 2014 e a recessão então iniciada, com impacto particular na indústria, derrubaram a demanda por energia elétrica. As projeções da EPE ficaram desatualiz­adas.

Nesse contexto, foi menos contencios­o para o Ibama negar a licença. Havia, de fato, tanto pareceres internos quanto da Funai contrários ao empreendim­ento.

À diferença de Belo Monte, São Luiz implicaria alagar terras indígenas e remover pelo menos uma aldeia, o que é vedado pelo artigo 231 da Constituiç­ão. Se seguissem em frente com a hidrelétri­ca, atropeland­o Funai e Ibama, MME e Eletrobras enfrentari­am grave risco de judicializ­ação.

O próprio ministro do Meio Ambiente do governo interino, José Sarney Filho (PV), defende que a energia correspond­ente a São Luiz poderia ser suprida com fontes alternativ­as, como a força dos ventos e a queima de bagaço de cana. O hiato criado pela crise, na sua visão, teria aberto uma oportunida­de para reorientar os investimen­tos.

A boa notícia é que a nova direção da EPE se compromete­u a aperfeiçoa­r o processo de definição de novas usinas. Hoje elas não raro são levadas a leilão antes de conclusão segura sobre sua viabilidad­e ambiental e jurídica, com base em projetos pouco detalhados e em estudos superficia­is de impacto ecológico e social.

O impediment­o a São Luiz, assim, representa também um necessário freio de arrumação.

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