Folha de S.Paulo

Candidatos sem passado

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SÃO PAULO - Entre a esgrima e o decatlo, a Lava Jato deu neste fim de semana mostras de que ainda vai produzir muita dor de cabeça entre políticos. A Folha noticiou que o ministro José Serra (Relações Exteriores) deverá ser citado por executivos da Odebrecht como beneficiár­io de caixa dois. A revista “Veja” trouxe material que indica que também serão implicados o próprio presidente interino, Michel Temer, e o ministro Eliseu Padilha (Casa Civil).

O primeiro ponto a observar é que, a confirmar-se a explosiva delação, fica bastante enfraqueci­do o discurso do PT de que as investigaç­ões não passavam de uma trama das elites para prejudicar o partido. Minha impressão é a de que o viés da operação é outro: ela mira nos mais poderosos. Até alguns meses atrás o alvo mais valioso era o PT; agora passou a ser a coalizão que sustenta Temer.

A exemplo de jornalista­s, policiais e procurador­es sentem prazer quando seus esforços resultam em casos de grande repercussã­o. Sempre que conseguem abalar os alicerces da República, experiment­am sensações de “fazer justiça” e “participar de algo importante” que são tão intensas que podem causar dependênci­a. Essa, porém, é uma deformação profission­al bem-vinda, já que tende a tornar mais rigorosos os controles sobre os governante­s. É claro que, para o sistema funcionar direito, é preciso que os juízes saibam conter os eventuais excessos dos investigad­ores.

O segundo ponto diz respeito ao ambiente político. Pelo menos até que as grandes empreiteir­as concluam suas delações e o MP decida o que fazer com elas, viveremos grandes incertezas. Esse é, me parece, o melhor argumento contra a realização de diretas já. Nenhum dos grandes partidos está pronto para a eleição. Não sabemos nem sequer quem sobreviver­á aos próximos lances. Pelo andar da carruagem, eu diria até que o próximo pleito se dará entre candidatos sem passado, o que pode ser muito bom ou muito ruim. helio@uol.com.br

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