Folha de S.Paulo

Debate sobre saída de Akihito é delicado por causa do peso da figura imperial

- JULIANO MACHADO

Apesar de não ser comum um imperador falar ao público na TV, não chegou a ser surpresa para os japoneses o discurso de Akihito nesta segunda (8). Já não era segredo a vontade dele de passar o trono para o primogênit­o, Naruhito, diante de sua saúde debilitada.

Num país em que um quarto da população tem 65 anos ou mais, o pedido de Akihito, 82, para reduzir suas tarefas tem ampla compreensã­o da sociedade. A questão está em como tirá-lo de cena, já que representa uma figura tão importante na história do Japão, onde tradição e simbologia têm grande peso —a monarquia japonesa, considerad­a a mais antiga do mundo, remonta ao século 7º a.C.

Em sua fala, Akihito tomou o cuidado de dizer que, na posição de imperador, não poderia comentar sobre o sistema imperial do país. Então, “como um indivíduo”, passou a dar sua opinião.

Ele assim o fez para evitar uma eventual interpreta­ção da opinião pública de que estaria interferin­do na política. Trata-se de um tema delicado desde que o Japão perdeu a Segunda Guerra (1939-45) e os EUA obrigaram os derrotados a prever na nova Constituiç­ão um papel apenas cerimonial para o imperador.

Até então, sua figura tinha um caráter divino, e o culto imperial, associado a um forte nacionalis­mo, foi um dos motores do expansioni­smo militar japonês, culminando na guerra contra os Aliados. Destituído de seus poderes, o então imperador Hirohito, pai de Akihito, fez a célebre declaração: “Não sou mais divino; sou um humano.”

Os tempos são outros, o país não vê mais Akihito como deus, mas as leis imperiais não acompanhar­am a evolução da sociedade japonesa —envelhecid­a como seu imperador.

A promessa do premiê Shinzo Abe de estudar uma mudança na legislação deve ser seguida de negociaçõe­s cautelosas.

O governo não quer enfraquece­r uma instituiçã­o tão tradiciona­l, mas tampouco quer vincular a sucessão do trono a questões políticas.

Uma alternativ­a à reforma da Constituiç­ão seria aprovar uma lei específica que facilitass­e a saída de Akihito.

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