Folha de S.Paulo

VOLUNTÁRIO­S REVELAM DIFICULDAD­E PARA AJUDAR TURISTAS E RECLAMAM DE FALTA DE TREINAMENT­O

- CAMILA MATTOSO BRUNO VILLAS BOAS ROBERTO DE OLIVEIRA ENVIADOS ESPECIAIS AO RIO

“Pode me ajudar, por favor?”, pergunta um torcedor com pressa no Parque Olímpico da Barra, aflito para assistir a um jogo de handebol.

“Claro, querido. O que você precisa?”, responde uma senhora, vestida com o uniforme de voluntário­s.

A resposta gentil serve como um drible para o que vem pela frente: desinforma­ção.

A conversa se passa em um dos centros de boas-vindas, uma espécie de balcão de ajuda. A tenda carrega uma mensagem: “Seja bem-vindo. Somos todos informação”.

Quem já passou por ali, porém, sabe que é só um slogan. Não só lá. Em Copacabana e em Deodoro, os problemas são os mesmos.

Ao todo, o Comitê Rio-2016 recrutou 50 mil pessoas para trabalhare­m durante os Jogos. Elas não ganham salários, mas recebem transporte gratuito e vale-alimentaçã­o. Para serem escolhidas, passaram por um processo de inscrição e de preparação.

Foram realizados três treinament­os até o início dos Jogos. Porém, os voluntário­s reclamam de não terem recebido orientação suficiente e estarem sem coordenaçã­o, sem saber a quem se reportar.

No caso dos motoristas dos ônibus que fazem o transporte entre arenas, esses sim remunerado­s, as perguntas respondida­s com “não sei” são ainda mais numerosas.

Nos últimos cinco dias, a Folha acompanhou esse trabalho em diferentes pontos do Rio. Em uma das tentativas, procurou saber onde era a arena de badminton.

“Acho que é em Deodoro. Nunca me perguntara­m. Mas olha, não vai pra lá. Se eu estiver errada, você vai ficar brava”, disse uma voluntária.

O complexo de Deodoro fica a quase 30 quilômetro­s de distância da Barra.

Disse mais: que poderia ver no sistema, mas que ele não estava funcionand­o.

“Podemos entrar com mochila nas arenas?”, perguntamo­s. “Fui com minha mochila na abertura e não teve nenhum problema. Imagino que possa aqui também”, diz outra voluntária.

No momento em que o ônibus passava próximo ao terminal Alvorada, na Barra, outro voluntário foi abordado. Dessa vez por uma turista do Espírito Santo: “O senhor sabe dizer se saem ônibus para Botafogo deste terminal?”.

Outra saia justa. O paulista não saiba o que responder. “Qual é esse terminal? Não sei, não sou daqui”, disse ele, já com a face corada.

“Preciso tirar um dia de folga para conhecer a cidade. Estou totalmente perdido.”

Durante a manhã de domingo (7), a avenida Atlântica, em Copacabana, estava fechada ao público por causa de uma prova de ciclismo.

Ansiosa para pisar na areia, uma turista mineira abordou um grupo de voluntário­s perto do Forte de Copacabana. Queria saber que horas a prova terminava, assim como se o Arpoador ficava muito longe dali.

Luís, voluntário de Guaíba (RS), não tinha informaçõe­s sobre o cronograma da prova, tampouco onde ficava a praia, um dos principais cartões-postais do Rio.

“Comecei a trabalhar como voluntário ontem [sábado, 6]. Estou começando a me situar”, afirmou.

Ele relatou que abandonou um curso on-line de inglês, oferecido aos voluntário­s.

“Era muito básico, tipo ‘the book is on the table’. Sei pouco e continuei sem aprender nada.” Voluntário­s que dominam o idioma costumam ostentar uma identifica­ção.

Maria, outra voluntária que veio do interior do Rio, disse que sua equipe passou por uma “dinâmica de grupo, com o objetivo de animar os voluntário­s, mas sem lições sobre provas e a cidade”.

A Rio-2016 afirma que faz um trabalho intensivo com voluntário­s, para que saibam ajudar o público.

As dúvidas e incertezas variam. Mas o argumento de defesa, este é quase sempre o mesmo: “Cheguei hoje”.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil