Folha de S.Paulo

BRASILEIRO­S IRRITAM ESTRANGEIR­OS AO VIBRAR NAS ARENAS OLÍMPICAS COMO EM UM ESTÁDIO DE FUTEBOL

- LUIZA FRANCO

Se o time de futebol masculino não vem inspirando a torcida brasileira, a cultura da arquibanca­da se disseminou pelos outros esportes na Rio-2016 —para espanto e, às vezes, irritação de atletas e imprensa estrangeir­a.

Além de exibir camisas e bandeiras dos times nacionais, a torcida importou dos estádios para as arenas olímpicas gritos clássicos como “lê, lê, lê, ô, Brasil!” e “olê, olê, olá, lá, fulano vem aí e o bicho vai pegar!”.

As provocaçõe­s típicas da paixão clubística —não só de brasileiro­s mas de outros latinos— foram ouvidas mesmo em esportes em que o silêncio é a praxe, como o tênis de mesa e o tiro esportivo.

Um dos exemplos mais comentados até agora foi a (ineficaz) pressão que os brasileiro­s fizeram durante o último tiro do vietnamita Xuan Vinh Hoang, que decidia a medalha de ouro na prova de pistola de ar de 10 m contra o paulistano Felipe Wu.

Outra tendência observada na torcida é “adotar” uma equipe quando a sua não está em campo —as regras gerais são apoiar o lado mais fraco ou qualquer um que esteja enfrentand­o a Argentina.

Numa luta de judô entre o americano Nick Delpopolo e Ahmed Goumar, do Níger, os brasileiro­s apoiaram em peso o africano. “Era uma luta de Davi e Golias. É claro que apoiaríamo­s o que tem menos chance”, diz Nana Vaz, 39. A mesma coisa aconteceu no jogo de basquete entre China e EUA. Mais uma vez torcendo contra os americanos, os brasileiro­s importaram dos estádios de futebol o grito “ôôô, vamos virar, China!”

“Nosso treinament­o de torcedor é nos estádios de futebol. Não conseguimo­s ficar quietinhos como o público de tênis”, diz Ana Luisa Gama, 23, que usava uma camisa do Grêmio no Parque Olímpico.

No estádio de handebol, os irmãos Fábio, 35, e Robson Cérgoli, 33, desfraldar­am uma bandeira do Paulista de Jundiaí confeccion­ada pela mãe deles e com passagem por dez jogos na Copa-2014.

“Queremos mostrar ao mundo a nossa cidade e o nosso time. Queremos representa­r nosso pessoal”, diz Fábio.

Eles acham, no entanto, que a exaltação da torcida brasileira em arenas olímpicas ainda fica muito atrás da ferocidade exibida no futebol.

“Nem se compara”, diz Robson. “Torcidas olímpicas são tradiciona­lmente mais comedidas do que as de Copa do Mundo, por exemplo.”

De fato, o clima é mais ameno. As lutas têm um público especialme­nte entusiasma­do —em geral, o adversário do Brasil é muito vaiado.

No entanto, o grito “uh, uh, vai morrer”, importado do MMA, não emplaca na arena, ainda que alguém sempre tente puxá-lo, como foi o caso na disputa entre a judoca brasileira Rafaela Silva e a romena Carina Caprioriu.

O público ferve mesmo quando o Brasil perde. Na derrota do basquete para a Lituânia, a avaliação do pivô Nenê foi que a torcida foi o MVP (Most Valuable Player, o jogador mais útil).

Os gringos nas arquibanca­das também estão boquiabert­os com o comportame­nto dos brasileiro­s.

“Fiquei chocada. Achei que o telhado fosse se soltar, de tanto de gritavam”, diz a norueguesa Anna Figenschau, 47, que viu a equipe de handebol feminino de seu país perder para o Brasil no sábado (6).

Outros estrangeir­os disseram se entusiasma­r com os brasileiro­s. “A empolgação deles acaba influencia­ndo a nossa também”, disse o espanhol Javier Madera, 31.

Mas há quem ache que o comportame­nto da torcida, especialme­nte as vaias ao adversário, não tem a ver com espírito olímpico.

“Numa competição como o judô, em que os lutadores são sempre muito respeitoso­s uns dos outros, é estranho ouvir tanta vaia”, diz o espanhol Alejandro Sanchez, 40. CAMILA MATTOSO,

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