Folha de S.Paulo

Estiagem histórica atrasa comida e ameaça água em região amazônica

Rio Acre está no nível mais baixo em 40 anos, e comida leva dobro do tempo para chegar a Manaus

- FABIO PONTES COLABORAÇíO PARA A FOLHA, EM MANAUS

Navegação foi limitada, há comprometi­mento de poços, e capital cogita racionar água pela primeira vez

Em Manaus, alimentos que chegavam em quatro dias demoram agora o dobro do tempo e podem ficar mais caros. Em Rio Branco, poços secaram e existe risco de racionamen­to. Mais raso, o rio Madeira, de Rondônia ao Amazonas, está com a navegação limitada durante a noite.

Motivo de orgulho nacional, exaltada na abertura da Olimpíada na última sextafeira (5), a Amazônia, em sua região sul, sofre um recorde histórico de estiagem.

O fenômeno El Niño, iniciado em 2015, tem sido o principal responsáve­l pelos impactos na área. Há também os efeitos da pecuária em margens de rios, que destrói a mata ciliar, além do desvio de igarapés para abastecer fazendas próximas (leia texto nesta página).

O rio Acre, única fonte de captação de água em Rio Branco, está no nível mais baixo dos últimos 40 anos, quando começaram as medições.

Na manhã desta segunda (8), ele alcançou a marca de 1,36 m —o recorde era de 1,5 m, em 2011. A situação já é crítica antes mesmo do tradiciona­l período de pico, entre o fim de agosto e setembro.

Em Rondônia e Amazonas, os rios também não tinham atingido níveis tão preocupant­es no período desde 1970.

A capital do Acre, com 371 mil habitantes, cogita pela primeira vez em sua história racionamen­to de água. A captação nos mananciais já está no limite crítico de 1.300 litros por segundo —abaixo disso, rodízio de água nos bairros será inevitável.

Um possível racionamen­to afetaria mais da metade dos habitantes de Rio Branco. Poços artesianos também já estão comprometi­dos diante da estiagem.

“Todos os dias recebemos dezenas de pedidos de pes- soas que pedem para ter as casas ligadas ao sistema, porque os poços secaram”, afirma Edvaldo Magalhães, diretor-presidente do Depasa, o departamen­to estadual responsáve­l pelo serviço. NAVEGAÇÃO RESTRITA O rio Madeira, em Rondônia, também alcançou níveis baixos, de 3,01 m, fora do esperado para o período. Com a situação, a Marinha limitou a navegação de embarcaçõe­s de carga durante a noite, por risco de ficarem presas em bancos de areia.

O trecho limitado segue de Porto Velho a Humaitá (AM). A Capitania Naval da Amazônia Ocidental não descarta a possibilid­ade de restringir a navegação noturna em outros trechos, bem como estender o limite para navios de passageiro­s.

Um dos reflexos é a viagem mais demorada de pessoas e de alimentos pelos rios, que são a principal “estrada” na região Norte do país.

Uma viagem entre as capitais Porto Velho e Manaus, que durava quatro dias, passou para sete. No sentido inverso, a demora é ainda maior: de oito para 15 dias. Das cargas que chegam a Manaus como gêneros alimentíci­os, grãos e material de construção, 40% dependem do rio Madeira.

O Sidarma, sindicato das empresas de transporte fluvial do Amazonas, já prevê alta de preços. “O que pode acontecer é um aumento no valor do frete e isso ser repassado para o consumidor final”, afirma o vice-presidente, Claudomiro Carvalho.

De acordo com o dirigente, empresas já estão reduzindo lucros, porque precisam transporta­r até 30% a menos de mercadoria, com a intenção de evitar acidentes.

Mesmo durante o dia, muitas encalham em bancos de areia, e é preciso o serviço de transbordo, quando a carga de uma balsa é levada para outra para reduzir o peso.

A estiagem também é uma ameaça ao colapso no fornecimen­to de gás, diesel e gasolina de uma refinaria da Petrobras em Coari (AM). Ela é a principal a abastecer os Estados do Acre e Rondônia com os três produtos.

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Rio Acre em trecho na capital, Rio Branco; leito atingiu nesta segunda-feira 1,36 metro, nível mais baixo dos últimos 40 anos, compromete­ndo o abastecime­nto em cidades próximas
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El Niño tem sido o principal responsáve­l pelos impactos da seca nas áreas do rio Acre

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