Folha de S.Paulo

A arte de se calar

- MIRIAN GOLDENBERG MIRIAN GOLDENBERG é antropólog­a, professora titular da Universida­de Federal do Rio de Janeiro e autora de “A Bela Velhice” (Ed. Record)

A ARTE de calar, um tratado escrito em 1771, afirma que o primeiro grau de sabedoria é saber se calar, o segundo é moderar-se no discurso e o terceiro é não falar demais. No tratado estão os seguintes princípios:

1. Só se deve deixar de se calar quando há algo a falar que valha mais do que o silêncio.

2. Há um tempo de se calar, assim como há um tempo de falar.

3. O tempo de se calar deve sempre vir em primeiro lugar e nunca se pode falar bem quando não se aprendeu antes a calar.

4. Não há menos franqueza ou imprudênci­a em se calar quando se é obrigado a falar do que leviandade e indiscriçã­o em falar quando se deve calar.

5. É certo que há menos risco em se calar do que em falar.

6. O homem nunca é tão dono de si mesmo quanto no silêncio.

7. Quando se tem uma coisa importante para falar, é necessário dizê-la primeiro a si mesmo para evitar que haja arrependim­ento quando já não se tiver o poder de voltar atrás no que se declarou.

8. Quando se trata de guardar um segredo, calar-se nunca é demais.

9. O silêncio do sábio vale mais do que o arrazoado do filósofo.

10. O silêncio muitas vezes passa por sabedoria em um homem limitado e capacidade em um ignorante.

11. Mais vale passar por não ser um gênio de primeira grandeza, permanecen­do em silêncio, do que por louco, abandonand­o-se à comichão de falar demais.

12. A caracterís­tica de um homem corajoso é falar pouco e executar grandes ações. A caracterís­tica de um homem de bom senso é falar pouco e dizer sempre coisas razoáveis.

13. Se houver muita paixão em falar uma coisa, este será um motivo suficiente para se calar.

14. O silêncio é necessário em muitas ocasiões, mas é preciso sempre ser sincero; podem-se reter alguns pensamento­s, mas não se deve camuflar nenhum.

A arte de se calar provoca uma reflexão mais do que necessária em um momento em que muitos brasileiro­s parecem ter opinião sobre tudo, falam compulsiva­mente e são violentos contra os que têm ideias diferentes. Não é à toa que muitas pessoas reclamam que os outros não sabem escutar com atenção e respeito as suas opiniões.

Em tempos de muito ruído, tagarelice e blá-blá-blá, com tantas queixas sobre a falta de escuta e de diálogo, você sabe quando é o momento certo de calar?

Ficar em silêncio provoca uma reflexão no momento em que muitos parecem ter uma opinião sobre tudo

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