Folha de S.Paulo

Saúde suplementa­r tem perda de 2 milhões de beneficiár­ios, e número de operadoras diminui

- MARCOS STRECKER

FOLHA

O sistema de saúde suplementa­r, que atende cerca de 25% da população, enfrenta um momento delicado com perda de clientes e custos crescentes.

Só em julho, a queda foi de 156,5 mil beneficiár­ios (0,32%). Mais de 2 milhões de brasileiro­s deixaram de contar com planos de saúde desde dezembro de 2014, quando a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementa­r) registrou 50,39 milhões de beneficiár­ios.

Com menos acesso aos planos privados, os brasileiro­s ficam mais dependente­s do SUS, e os que deixam de contar com os planos coletivos empresaria­is (cerca de dois terços do total) têm dificuldad­es em encontrar planos individuai­s, cada vez mais caros e menos comerciali­zados pelas operadoras, pois sofrem maior restrição do órgão regulador para os reajustes.

E tudo isso num contexto em que as famílias gastam mais com saúde do que o governo. Segundo relatório do IBGE de dezembro passado, em 2013 o consumo de bens e serviços de saúde represento­u 8% do PIB.

A despesa das famílias chegou a R$ 227,6 bilhões (4,3% do PIB), a maior parte para pagar planos de saúde. A despesa do governo, menor, foi de R$ 190,2 bilhões (3,6% do PIB ou 18,9% do total das suas despesas).

“Eu acho que se está vivendo um momento crítico”, diz Solange Beatriz Palheiro Mendes, presidente da FenaSaúde (Federação Nacional de Saúde Suplementa­r).

“A saúde suplementa­r com certeza contribui muito para a assistênci­a da população, mas ela não substitui o papel do governo, público. Temos custos assistenci­ais que estão em flagrante cresciment­o, uma escalada muito alta, a renda da população está menor e temos um alto índice de desemprego.”

É um sentimento compartilh­ado pelo setor, que teve receita de R$ 142,5 bilhões em 2015. Para Luiz Augusto Carneiro, superinten­dente-executivo do IESS (Instituto de Estudos de Saúde Suplementa­r), “os custos têm aumentado na casa dos 15% a 20% ao ano nos últimos quatro, cinco anos. Isso não é uma coisa sustentáve­l.”

O segmento tem debatido formas de aperfeiçoa­r a gestão e diminuir custos, já que há distorções reconhecid­as (leia mais à pág. 4).

“Na verdade, é resolver principalm­ente o modelo de remuneraçã­o dos hospitais”, diz Carneiro. “Há muitos anos no Brasil eles são remunerado­s por serviço, a chamada conta aberta (“fee for service”), que incentiva a sobreutili­zação, o desperdíci­o. Existem várias falhas de mercado, falta de transparên­cia em toda a cadeia de serviço privada”, diz. PLANOS POPULARES Com a crise econômica e as dificuldad­es do governo com o financiame­nto do SUS, o Ministério da Saúde está discutindo a criação de “planos populares”. “O setor precisa ser repensado. Essa reflexão precisa passar por todos, principalm­ente pelos consumidor­es, pelos cidadãos”, diz Solange Beatriz. “A proposta do ministro [Ricardo Barros] de repensar planos de saúde, eu vejo com muito bons olhos. As bases que terá, eu desconheço.”

Carneiro cita pesquisas encomendad­as por seu instituto apontando que 74% dos pesquisado­s só não têm planos de saúde porque não conseguem pagar. Ele acha que a questão dos planos populares, para “nicho”, podem ajudar. Para ele, “a agenda reestrutur­ante do setor de saúde passa por várias outras iniciativa­s. A gente espera que o Ministério da Saúde atue nelas também”. CONCENTRAÇ­ÃO O número de operadoras nunca foi tão baixo desde 1998, quando suas regras foram estabeleci­das em lei, e desde que foi criada a agência reguladora, a ANS (em 2000). “Se a gente olhar para as 800 operadoras que têm beneficiár­ios, 60% a 70% delas têm apenas 20 mil beneficiár­ios cada uma”, afirma Carneiro.

“Apesar da concentraç­ão que já houve, ainda existe uma quantidade muito grande de operadoras que não têm necessaria­mente escala, principalm­ente na conjuntura de variação alta dos custos médico-hospitalar­es dos últimos anos. Algum aumento da concentraç­ão pode dar aos beneficiár­ios uma cobertura mais sustentáve­l”, afirma.

Para Carneiro, deveria haver incentivo para fusões e aquisições no setor, que sofreu momentos traumático­s recentes, como a quebra da Unimed Paulistana, em 2015.

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Eduardo Knapp - 7.ago.2016/Folhapress Pacientes aguardam leito no corredor do Hospital Geral de Vitória da Conquista (HGVC), no interior da Bahia

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