Folha de S.Paulo

Ao lado de seus principais assessores, os ex-ministros José Eduardo Cardozo (Advocacia-Geral da União), Jaques

- MARINA DIAS

DE BRASÍLIA

Em sua última defesa no julgamento do Senado, Dilma Rousseff pretende fazer um discurso de caráter pessoal em que dirá que o processo de impeachmen­t foi criado de maneira artificial para tirá-la do cargo após “vingança” e “chantagem” do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

O pronunciam­ento que Dilma fará na segunda (29) no plenário do Senado para se defender das acusações de que cometeu crime de responsabi­lidade fiscal ainda está em fase de construção e deve ser fechado domingo (28), com ajuda do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Obcecada por detalhes, a petista estuda cada citação até a última vírgula, contam auxiliares, e tem lido textos do período do presidente Getúlio Vargas para se inspirar na redação do discurso.

A ideia da presidente afastada é fazer uma fala menos jurídica e técnica, estilo ao qual sempre foi mais afeita, para apostar em trechos autorais e emocionais sobre sua trajetória na “luta pela democracia”. Ela quer reforçar a tese de que o processo está sendo realizado contra a Constituiç­ão e enumerar os efeitos do que chama de “golpe” nas esferas política, social e econômica do país.

Segundo aliados, a petista vai mostrar que o processo de seu impeachmen­t “ameaça” a estabilida­de democrátic­a e jurídica e deixará “marcas” na história do Brasil.

Um auxiliar de Dilma disse à Folha que ela está determinad­a a fazer de sua fala um “momento de impacto”, em busca do apoio dos senadores mas, mais do que isso, quer um “registro histórico”, diante de um cenário praticamen­te irreversív­el contra ela.

Os argumentos para justificar sua inocência serão os mesmos ecoados por sua defesa: não cometeu crime de responsabi­lidade fiscal e o processo foi “marcado” pelo “desvio de poder” de Cunha, responsáve­l por conduzir o impeachmen­t na Câmara. PREPARAÇÃO Wagner (Casa Civil) e Ricardo Berzoini (Secretaria de Governo), a petista tem trabalhado de dez a doze horas por dia no Palácio da Alvorada.

Desde o início da semana, reveza-se entre a elaboração de seu texto e as reuniões em que são traçados os perfis dos votos dos senadores.

Aliados montaram uma espécie de mapa em que os parlamenta­res são divididos por Estado, para facilitar a forma de abordá-los e convencer pelo menos 28 dos 81 senadores a votarem com Dilma.

Na terça (23), a contabilid­ade no Alvorada somava 22 votos, um a mais do que Dilma havia conseguido na sessão do Senado que encaminhou o processo para julgamento final, em 10 de agosto, mas seis a menos do que precisa para barrar seu afastament­o definitivo do Planalto.

Entre as sugestões que tem recebido de senadores e de seus auxiliares para seu discurso está ainda a referência direta a uma “manobra” que aliados do presidente interino, Michel Temer, estariam articuland­o para frear a Lava Jato.

Em conversas ocorridas em março, dois meses antes do afastament­o de Dilma do Planalto, o senador Romero Jucá (PMDB-RR) sugeriu ao expresiden­te da Transpetro Sérgio Machado que uma “mudança” no governo federal resultaria em um pacto para “estancar a sangria” representa­da pelas investigaç­ões.

Os áudios foram revelados pela Folha em maio e levaram à demissão de Jucá, que havia sido nomeado ministro do Planejamen­to por Temer. Dilma Rousseff preferiu não assistir à sessão do Senado pela TV. Bastante ansiosa, pediu que assessores mostrassem a ela os pronunciam­entos dos senadores aliados por escrito. De resto, passou o dia trabalhand­o em seu discurso de segunda-feira (29) no plenário da Casa. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve desembarca­r em Brasília no domingo (28) para ajudar a sucessora a fechar seu discurso. Auxiliares apostam na veia emocional de Lula, que deve assistir ao pronunciam­ento de Dilma direto do Senado. Ortopedist­a e crítico ferrenho do PT, o senador Ronaldo Caiado (DEM-GO) foi acionado por um paciente inesperado, o advogado de Dilma, José Eduardo Cardozo, que torceu o pé no último fim de semana. Deu a receita rapidament­e. “Disse que tinha que imobilizar, mas que começaria enfaixando pela boca”, narrou Cardozo aos risos. O deputado Fábio Ramalho (PMDB-MG) quis fazer um gesto aos colegas senadores e enviou um farto banquete ao gabinete de Renan Calheiros na presidênci­a do Senado, no intervalo do almoço. Tutu à mineira, leitão à pururuca e couve para 40 pessoas. Ministro do Supremo que atua como presidente da sessão de julgamento do impeachmen­t, Ricardo Lewandowsk­i não participou da comilança e almoçou no STF. Senadores que fazem oposição ao PT estão guardando a sete chaves os termos que usarão para se dirigir a Dilma na segunda. Líder do PSDB, Cássio Cunha Lima quis antecipar sua ideia, mas foi barrado por Agripino Maia (DEM-RN). “Não fala! Se vazar, estamos lascados.”

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Fotos Pedro Ladeira/Folhapress O senador Ronaldo Caiado (DEM-GO) discute com o Lindbergh Farias (PT-RJ) e Fátima Bezerra (PT-RN), na quinta (25)
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Gleisi Hoffmann (PT-PR) acusa os demais senadores de não terem autoridade moral pra julgar Dilma, suscitando reação

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