Folha de S.Paulo

HOUVE ATOS IRREGULARE­S; SENADO DECIDE SE DILMA FOI RESPONSÁVE­L POR ELES

Empréstimo­s bilionário­s de bancos estatais e aumento de crédito sem aval do Congresso embasam processo de impeachmen­t contra petista

- DE SÃO PAULO

DE BRASÍLIA

O senadores deram início nesta quinta-feira (25) à etapa final do processo de impeachmen­t de Dilma Rousseff (PT). Nos próximos dias, decidirão se a presidente ora afastada deve deixar definitiva­mente o cargo.

Embora na prática a resposta se limite a um único “sim” ou “não”, em tese os parlamenta­res terão em mente duas questões: 1) foram violadas leis que regulam o uso do dinheiro público? 2) se sim, Dilma deve ser responsabi­lizada por isso?

Dizer “sim” ao primeiro item é a parte fácil.

Acusa-se Dilma de ter autorizado despesas adicionais sem obter antes o necessário aval do Congresso —no jargão, trata-se de abertura de créditos suplementa­res.

Além disso, afirma-se que a gestão petista realizou as agora famosas pedaladas, manobras contábeis que disfarçava­m a tomada de empréstimo de bancos públicos.

As duas coisas acontecera­m, e ambas contrariam dispositiv­os da Constituiç­ão e da lei 1.079/50, que define os crimes de responsabi­lidade. RUÍNAS E MANOBRAS Não é segredo que a economia brasileira estagnou-se em 2014. Com a arrecadaçã­o em queda, o governo passou a dispor, a partir daquele ano, de menos dinheiro que o necessário para a almejada expansão das despesas.

A fim de ocultar o estado calamitoso das contas públicas —e assim aumentar os gastos públicos e a chance de reeleição da petista—, o governo recorreu às pedaladas, expediente que pode ser comparado a um abuso do cheque especial.

Muitos benefícios sociais (como Bolsa Família) são pagos aos cidadãos por meio de bancos públicos (Caixa e Banco do Brasil, entre outros), e não diretament­e pelo governo. Este, porém, deve repassar às instituiçõ­es cifras suficiente­s para fechar a conta.

Se sobra um pouco de dinheiro —por exemplo, se menos pessoas sacaram o benefício—, o banco o devolve, com juros. Se falta, o banco cobre a diferença, e o governo paga juros por isso.

Atrasos ou deficiênci­as nos repasses ocorreram em outras gestões, mas, sob Dilma, atingiram montantes inéditos. Ao final de 2015, o governo devia cerca de R$ 56 bilhões a seus bancos. Na prática, um empréstimo bilionário.

A ruína das contas públicas também esteve por trás dos créditos suplementa­res. Eles só foram editados antes de haver autorizaçã­o do Congresso porque o fruto da arrecadaçã­o frustraria os planos do Executivo.

Estabeleci­dos os fatos, os senadores precisarão chegar a uma conclusão sobre a segunda questão. Responsabi­lizar Dilma pelas pedaladas e pelos créditos suplementa­res, contudo, é tarefa que envolve boa dose de subjetivid­ade —ou de juízo político. CABEÇAS E SENTENÇAS Definir se houve participaç­ão direta de Dilma é parte importante do problema. A Carta Magna brasileira, em seu artigo 85, estabelece que são crimes de responsabi­lidade “os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituiç­ão”.

Alguns parlamenta­res poderão sustentar, como faz a defesa, que a petista não tomou decisões relativas às pedaladas e que apenas homologou definições técnicas nos créditos suplementa­res. Tudo não passaria de mero pretexto para o impeachmen­t.

Outros poderão afirmar que os fatos são inconteste­s e que o conjunto da obra atesta o envolvimen­to de Dilma.

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