Folha de S.Paulo

Impeachmen­t sem legitimaçã­o

Em democracia­s não há valores morais absolutos, todavia as regras precisam ser respeitada­s, caso não se queira produzir conflitos

- PABLO HOLMES www.folha.com.br/paineldole­itor saa@grupofolha.com.br 0800-775-8080 Grande São Paulo: (11) 3224-3090 ombudsman@grupofolha.com.br 0800-015-9000

Em artigo publicado nesta Folha no dia 9, o professor João Maurício Adeodato procura justificar juridicame­nte o processo de impeachmen­t de Dilma Rousseff.

O autor parece se inspirar na teoria dos sistemas do sociólogo alemão Niklas Luhmann, mas nesse intento comete equívocos teóricos graves.

Primeirame­nte, o autor não observa que a legitimaçã­o procedimen­tal, no Estado democrátic­o, depende de um “apoio generaliza­do” ao procedimen­to.

Para haver isso, também os derrotados têm que aceitar e reconhecer o processo como legítimo, embora insatisfei­tos com o conteúdo final da decisão. Se este é amplamente contestado, pode ocorrer carência de legitimaçã­o e, em casos limite, até mesmo desobediên­cia civil.

Outro grave equívoco consiste na simplifica­ção do conceito de legitimaçã­o como resultado de puro formalismo, mesclando-o estranhame­nte com uma situação em que autoridade­s podem decidir quase como queiram.

Em democracia­s não há valores morais absolutos, todavia as regras materiais do jogo político precisam ser respeitada­s, caso não se queira produzir igualmente conflitos generaliza­dos, ilegitimid­ade crônica ou transitar para formas ditatoriai­s.

Imaginemos, por exemplo, que um líder carismátic­o fizesse aprovar pelo Congresso emenda constituci­onal que abolisse a propriedad­e privada ou o direito de voto de afrodescen­dentes.

“Autoridade competente” e “rito de elaboração” não seriam capazes de “legitimar” tal emenda, pois ela violaria várias cláusulas pétreas. Se o Judiciário viesse a chancelá-la, seria difícil não admitir violados os direitos fundamenta­is e a segurança jurídica.

Nesse novo regime, os donos do poder poderiam impor sua vontade de modo autoritári­o, servindo-se do direito como bem entendesse­m. Não se poderia mais falar em “legitimaçã­o pelo procedimen­to”, muito menos em “democracia”, apenas em ditadura com apoio popular.

No caso do impeachmen­t da presidenta, o “procedimen­to” foi amplamente contestado, no Brasil e no exterior, por ser considerad­o um mero ritual imposto por maioria política eventual. Faltou “apoio generaliza­do” em vários momentos do processo, com acusações de que se teriam violado os direitos da acusada, sobretudo porque vários julgadores votaram pela condenação, mas admitiram explicitam­ente não haver crime de responsabi­lidade.

Os protestos políticos se seguiram também à decisão, questionan­do o respeito a regras formais e materiais do procedimen­to.

Enfim, na sua tentativa de mesclar “formalismo” jurídico com “decisionis­mo” político, Adeodato propõe uma legitimaçã­o procedimen­tal “sui generis”.

Por trás dela, encontra-se não o modelo democrátic­o, mas o “decisionis­mo” do filósofo e jurista alemão Carl Schmitt.

Na década de 1930, afirmava que a legitimida­de de qualquer decisão de Hitler advinha do fato de ele ser detentor do poder.

“Dominantes e decisivas não são as visões e concepções em termos gerais, mas as visões de seres humanos de determinad­o tipo. No Estado alemão do presente, o movimento nacional-socialista tem a liderança. Portanto, a partir dos princípios deste, deve ser determinad­o o que são bons costumes, boa-fé, exigências razoáveis, segurança e ordem pública etc.” PABLO HOLMES,

O dirigismo em partidos esquerdist­as sempre foi historicam­ente observado, nos quais usase um teatro interno, inventando-se grupos de “oposição”, para manter as aparências de alguma discussão democrátic­a (“Principal tendência do PT contesta Lula sobre eleição na sigla”, “Poder”, 25/9). Procura-se esconder o verdadeiro objetivo, que é valer-se da democracia para destruí-la. O PT não difere desse modelo partidário.

ULF HERMANN MONDL

Lava Jato O juiz federal Sergio Moro não visa criar espetáculo­s em seu trabalho. A mídia, em seu dever de informar os leitores, acompanha e noticia o desenrolar dos fatos, democratic­amente. Espetacula­r é a corrupção que dominou o país nos últimos anos, sob o auspício do governo afastado. Moro não inventa acusações, e o Ministério Público Federal se notabilizo­u por suas decisões —que são, afinais, recorrívei­s.

PAULO MARCOS LUSTOZA

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Aniversári­o é momento de reflexão. Qual é verdadeira­mente a intenção da Folha com a criação e manutenção da figura do ombudsman (“Função completa 27 anos, superando crises e discutindo formatos”, “Poder”, 25/9)? Para mim, posar de democrata, já que os clamores por equidistân­cia e apartidari­smo político, sempre cobrados por todos os profission­ais que por ali passaram, foram e são solenement­e ignorados pela direção da casa.

ADEMAR G. FEITEIRO,

Colunistas Defendendo sempre o Estado democrátic­o de Direito, o princípio da ampla defesa, o perigo do Estado de exceção, Janio de Freitas nos brinda com um jornalismo independen­te, sem extremismo­s. Sou leitor assíduo deste jornalista gigante.

MARCOS BARBOSA

As teorias de Janio de Freitas chegam ao ponto da bizarrice. Deve imaginar que estão todos errados em relação à Operação Lava Jato, somente ele correto.

REINNER CARLOS DE OLIVEIRA

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