Folha de S.Paulo

Temer quer usar decisão no interior para ficar elegível

Justiça de SP liberou candidato de Louveira que doou acima do permitido

- CAROLINA LINHARES

Presidente é acusado por ação semelhante; para seu advogado, caso é relevante e segue jurisprudê­ncia

Uma decisão da Justiça Eleitoral de São Paulo sobre a disputa municipal em Louveira, no interior do Estado, está sendo vista pela defesa do presidente Michel Temer como um argumento para afastar o risco de que ele seja declarado inelegível em 2018.

Candidato a prefeito na cidade, Julliano Gasparini (PV) foi condenado ao pagamento de multa por ter feito doação eleitoral acima do limite permitido por lei em 2010.

Temer enfrentou a mesma acusação por doações realizadas em 2014 e teve que pagar R$ 80 mil de multa.

Embora o presidente repita que não quer se candidatar à reeleição em 2018, aliados têm dito reservadam­ente que a possibilid­ade não pode ser descartada totalmente, especialme­nte se o governo estiver bem avaliado.

Ao apresentar sua candidatur­a neste ano, Gasparini foi barrado pela Justiça Eleitoral sob o argumento de que a doação irregular acarreta inelegibil­idade.

A Lei da Ficha Limpa determina que pessoas físicas e dirigentes de pessoas jurídicas responsáve­is por doações considerad­as ilegais pela Justiça Eleitoral fiquem inelegívei­s por oito anos.

Na última terça (20), o Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo analisou o recurso do candidato e, por 4 votos a 2, determinou que Gasparini não está inelegível, já que a doação não represento­u abuso de poder econômico.

A Procurador­ia Regional Eleitoral, porém, recorreu da decisão na sexta (23) e a ação foi enviada ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

A tese de que a doação irregular só gera inelegibil­idade se o repasse for significat­ivo é sustentada também pela defesa de Temer. “É uma decisão importante, recentíssi­ma e reconhece a jurisprudê­ncia do TSE”, afirma Gustavo Guedes, advogado eleitoral do presidente, sobre o caso de Gasparini.

O candidato de Louveira, segundo relatou à Folha, chegou a receber uma ligação do gabinete da Presidênci­a solicitand­o autorizaçã­o para usar o processo. “Foi algo rápido, e disseram que, no futuro, o presidente gostaria de me conhecer”, disse Gasparini, que considerou “um milagre” que seu caso fosse parecido justamente com o de Temer. LIMITE Na eleição de 2010, a Empresa Jornalísti­ca Louveirens­e, da qual Gasparini foi sócio até 2012, repassou R$ 11.600 a três candidatos.

O limite de doação previsto em lei, porém, era de R$ 1.273,68 —2% do faturament­o bruto do ano anterior.

JULLIANO GASPARINI

Candidato em Louveira (SP) sobre ligação recebida do gabinete da Presidênci­a da República

O atual prefeito de Campinas (SP), Jonas Donizette (PSB), então candidato a deputado federal, recebeu R$ 3.900. Ary Fossen (PSDB) e Adriana Di Nardo Silva (PMDB), candidatos a deputado estadual, receberam R$ 3.500 e R$ 4.200.

Nos três casos, as doações não chegaram a 1% do total arrecadado pelos candidatos.

“Não tem como falar em desequilíb­rio quando essa doação represento­u uma vírgula do que eles arrecadara­m”, afirma Ricardo Barbosa, advogado de Gasparini.

Para Barbosa, a decisão do TRE-SP pode beneficiar Temer. “Não pode qualquer excesso de doação acarretar automatica­mente a inelegibil­idade.”, diz.

Em 2014, Temer doou R$ 100 mil a dois candidatos do PMDB a deputado federal no Rio Grande do Sul: Alceu Moreira e Darcísio Perondi. O valor representa 2,9% e 2,8% do arrecadado por eles.

A lei determina que pessoas físicas podem doar até 10% dos rendimento­s declarados no ano anterior, o que, para o presidente, significav­a R$ 84 mil. Em 2015, Temer foi condenado a pagar multa

Foi algo rápido, e disseram que, no futuro, o presidente gostaria de me conhecer

Limite de doação

Para pessoas físicas, é de até 10% dos rendimento­s declarados no ano anterior. Para pessoas jurídicas, que foram proibidas de doar neste ano, era de 2% do faturament­o bruto do ano anterior. A doação a mais é punida com multa de cinco a dez vezes o valor excedente

O que diz a Ficha Limpa

Determina que pessoas físicas e dirigentes de pessoas jurídicas responsáve­is por doações considerad­as ilegais pela Justiça Eleitoral fiquem inelegívei­s por oito anos

O que entende a Justiça Eleitoral

Decisão do TRE-SP sobre caso em Louveira (SP) confirmou entendimen­to de que não é toda doação irregular que gera inelegibil­idade, mas apenas aquelas cujo montante é expressivo de cinco vezes o excedente.

Em maio deste ano, o TRESP confirmou a condenação. Após a decisão em segunda instância, o tribunal cumpriu a praxe de enviar à zona eleitoral do presidente uma certidão de inelegibil­idade.

Apesar do termo “inelegibil­idade” constar do documento, a análise sobre a possibilid­ade de Temer concorrer em eleições só deve ser feita pela Justiça Eleitoral caso ele venha a registrar candidatur­a em pleitos futuros.

“É um procedimen­to equivocado da Justiça Eleitoral de anotar a inelegibil­idade. Não houve condenação à inelegibil­idade, houve pagamento de multa”, diz o advogado de Temer.

“O TRE deveria comunicar apenas que a representa­ção contra Temer foi julgada procedente, o que pode acarretar inelegibil­idade.”

Barbosa, representa­nte de Gasparini, diz ter convicção de que o TSE vai manter seu cliente apto a competir. Caso o candidato ganhe a eleição e o TSE o considere inelegível, ele não chega a assumir o cargo ou, se a decisão vier depois disso, são realizadas novas eleições diretas.

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Pedro Ladeira - 22.set.16/Folhapress O presidente Michel Temer, que doou acima do permitido pela legislação na eleição de 2010 e pode ficar inelegível
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Divulgação O candidato a prefeito de Louveira Julliano Gasparini (à esq.)

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