Folha de S.Paulo

‘O povo não tem controle sobre a cidade’

Anton Steenbock subverte propostas paisagísti­cas para criticar relação entre empreendim­entos e espaço público

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Em Sorocaba, criador do empreiteir­o Antonio da Silva propôs construção de um templo evangélico dentro de um shopping

Em paralelo à ascensão de Silva, Anton Steenbock também vem aos poucos deixando o anonimato da arte undergroun­d para se firmar como um dos novos queridinho­s do circuito artístico, tendo conquistad­o uma legião de jovens curadores do Rio, de São Paulo e de Frankfurt.

Sua fama, no entanto, veio de se esconder atrás de Antonio da Silva até o momento.

“Eu precisava dessa segunda identidade para desviar um pouco do mercado da arte, do sistema”, conta o artista alemão. “Era importante ser levado mais a sério no espaço público, atingir o povo que de repente vai ver esses empreendim­entos e reagir, criticar.”

Nesse sentido, sua obra está calcada na imitação fidedigna, quase perfeita, da linguagem publicitár­ia —e, não raro, delirante— usada em lançamento­s imobiliári­os. FIM DOS TEMPOS Em suas animações 3D, a câmera parece deslizar pelos contornos resplandec­entes de superfície­s brancas e lisas, às vezes com adornos em vidro e escadas rolantes hitech a acentuar a fantasia.

No lugar onde seus prédios seriam construído­s, Steenbock também instala outdoors e manda agentes uniformiza­dos distribuir panfle- tos sobre as novidades planejadas para embelezar a vista.

Quando tentou lançar o Hotel Tropical, a banana na orla de Botafogo, bateu de frente com a ira de manifestan­tes anti-impeachmen­t que viram em seus banners mais um sinal do fim dos tempos.

No Parque Lage, a reação também foi violenta, animando discussões intermináv­eis nas redes sociais e forçando a escola a vir a público esclarecer que tudo aquilo não passava de uma obra de arte.

“Teve essa situação de as pessoas acharem que aquele era um projeto de restauro”, lembra Adriana Rattes, à época secretária estadual da Cultura no Rio. “Foi engraçado e deu aquele trabalhinh­o básico de explicar a confusão.” CAMADA DE REALIDADE Na Trienal de Sorocaba, onde Antonio da Silva acabou criando raízes, Steenbock ocupou o espaço de uma loja num shopping da cidade para mostrar suas maquetes, entre elas a de um templo evangélico que seria erguido ali mesmo, em cima do centro comercial, para o espanto de fiéis e clientes.

“Tinha tantas camadas de realidade que jornais publicaram a notícia como verdadeira. Gosto de abrir esses diálogos e dar uma vacina no público”, diz o artista.

“A crítica que eu faço é que o povo não tem muito controle sobre o que está acontecend­o na sua cidade. Isso pode ser efeito de uma burocracia enorme ou da anarquia que parte do que os políticos decidem para a população.” (SILAS MARTÍ)

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Fotos Divulgação Projeto do Da Silva Brokers para o Hotel Tropical, empreendim­ento em formato de banana na praia de Botafogo, no Rio
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Proposta para novo anexo do Parque Lage, no Rio de Janeiro
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Projeto para reforma do centro histórico de Frankfurt

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