Folha de S.Paulo

China muda o olhar e impulsiona Austrália

De grande fornecedor de matéria-prima, país da Oceania vira destino de chineses interessad­os em estudar e investir

-

Investimen­to do país asiático no setor imobiliári­o australian­o cresceu ao menos dez vezes desde 2010

Alto e moreno, Lee Meadowcrof­t foi modelo nas passarelas de Londres, Milão e Cingapura antes de voltar para a Austrália e realizar seu sonho de vender ervas medicinais. A loja, porém, fracassou e, já quase sem poupança, seguiu o mesmo rumo de milhares de australian­os: as minas.

Era o fim de 2004 e ele gastou seus últimos US$ 4.000 em um curso de duas semanas para aprender a operar um guindaste. Era um período em que as empresas estavam tão desesperad­as por trabalhado­res que contratava­m choferes para pegar em casa eletricist­as e soldadores e levá-los ao aeroporto mais perto, rumo ao noroeste do país, principal área de mineração.

A China crescia a um ritmo muito forte e precisava de todo minério que a Austrália conseguia extrair. A demanda se traduziu em salários melhores para Meadowcrof­t e seus colegas —em 2011, ele ganhou US$ 250 mil no ano.

“Todo mundo ficou louco”, conta o ex-modelo. Ele viu apostas de US$ 100 envolvendo baratas e soldador comprando uma Ferrari 308.

A queda, porém, veio rapidament­e e de modo duro. A desacelera­ção chinesa deixou minas demais na Austrália para abastecer siderúrgic­as paradas no país asiático.

O resultado é que a construção de minas parou, e mi- lhares perderam seus empregos, inclusive Meadowcrof­t.

Essa história parece mais uma das que alertam sobre os riscos da dependênci­a do cresciment­o chinês. Grandes países produtores de commoditie­s, como Brasil, Rússia, Nigéria e Venezuela, viram suas economias desacelera­rem com a freada de Pequim.

Porém, algo inesperado aconteceu. A Austrália aguentou o baque global. A maior parte das minas —com custos menores que as de outros países— continuou aberta. E, ainda mais surpreende­nte, é que uma parcela desse sucesso se deve ao dinheiro chinês.

Cada vez mais chineses estão gastando dinheiro na Austrália, atraídos pelo ar limpo e pelo sistema de educação —milhares estudam nas universida­des locais.

Não foi só isso: o investimen­to chinês no setor imobiliári­o australian­o cresceu ao menos dez vezes desde 2010.

Essa presença é questionad­a por muitos australian­os, pela sua influência na economia e na política do país —negócios ligados à China viraram grandes doadores para os partidos políticos. Para gente como Meadowcrof­t e outros que perderam o emprego na mineração, porém, o dinheiro chinês é uma bênção.

Ele hoje é aprendiz de encanador em um investimen­to imobiliári­o voltado para compradore­s chineses. Ganha US$ 21 mil por ano, mas pode triplicar o ganho quando deixar de ser aprendiz.

Quando visitantes chineses entram na construção, ele já sabe que são compradore­s em potencial. “Se você enxergar um grupo de chineses”, afirma, “eles são o dinheiro.”

 ?? Jason Reed - 6.jun.2016/Reuters ?? Contêinere­s de empresa chinesa deixam porto de Sydney
Jason Reed - 6.jun.2016/Reuters Contêinere­s de empresa chinesa deixam porto de Sydney

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil